AULA 8
Tema: Despesa pública.
Introdução, conceitos e programação da despesa.
Noções
introdutórias:
Tomemos como exemplo para
reflexão as seguintes situações:
a) Alguém
que realiza uma limpeza em sua residência e disto resulta uma quantidade
expressiva de resíduos, que é coletada pelo serviço público executado pelo
município;
b)
Município que coleta resíduos, mas não investe ou não se ocupa, em suas
prioridades, de estimar adequadamente a capacidade de tratamento e de deposição
dos mesmos em aterro que termina por não mais suportar recebê-los;
c)
Desastres e tragédias que resultam em deslizamentos, mortes ou em número
expressivo de desabrigados;
d)
Queimadas urbanas não controladas que contribuem para o aumento do número de
casos de doenças respiratórias;
e)
Demandas por aumentos de vencimentos por iniciativa de servidores públicos;
f)
Moradores que expõem a necessidade da ampliação de unidade de atendimento de
saúde em seu bairro, ou de pavimentação, ampliação de ruas, reparos, construção
de escolas;
g) Construção
de estádios, investimento em infra-estrutura turística;
h)
Prefeito que firma convênio com associação civil para a construção de uma pista
de boliche;
i)
Aquisição de um helicóptero para o atendimento das necessidades de mobilidade
do governador do Estado;
j)
Aquisição de equipamentos de iluminação pública e sua substituição na hipótese
em que não se demonstre deficiência no funcionamento, mediante a contratação de
operação de crédito;
Temos em
todos os casos a exposição de gastos por iniciativa do Poder Público para o
atendimento das mais distintas finalidades, que representam demandas
existenciais de diferentes naturezas, seja para o fim da proteção de
necessidades prioritárias ao desenvolvimento de padrões mínimos de existência
digna, seja para elevar esta qualidade de vida, ou simplesmente, para a
ampliação dos instrumentos da ação pública para o fim de assegurar que esta
possa atender a coletividade em uma perspectiva duradoura. Disto se trata, em
última análise, da despesa pública. Esta representa uma realidade de decréscimo
patrimonial, que tem vinculação com fontes de recursos específicas, seja para a
manutenção da ação pública, seja para o seu aperfeiçoamento. Tem-se aqui, um
cenário de variação negativa do patrimônio público, representando não apenas
uma situação de saída compensatória, senão um decréscimo irreversível ao mesmo.
Estamos tratando aqui das transformações concretas na realidade social e
econômica, frequentemente por iniciativa de políticas públicas, cujos efeitos
se refletem em despesas. Direitos fundamentais e sua concretização representam,
em última análise, despesas públicas, sendo estes, os efeitos materiais de
escolhas públicas sobre como transformar uma determinada realidade para o fim
de atingir determinados objetivos.
IMPORTANTE: Muito
embora o Direito Financeiro proponha uma aproximação e uma investigação sobre o
processo que proporciona que as tarefas estatais possam ser concretizadas, e
que se traduz na transformação ou conversão de patrimônio em realidades existenciais
de interesse público (convertendo, portanto, recursos financeiros à sua
disposição em bem-estar no interesse de uma universalidade de demandas), isso
não quer dizer que a atividade financeira somente se destina ao custeio das
prestações estatais a que está obrigado perante os particulares, em nome de uma
noção de mínimo existencial, de qualidade e da dignidade de vida. Mesmo
direitos vinculados a uma realidade eminentemente privada ou associados ao
conjunto dos direitos de liberdade, não decorrem exclusivamente da vontade de
seu titular para que possam proporcionar o efeito (o grau ou o nível de
bem-estar) que esteja vinculado à determinada norma. Proteção da propriedade
privada, exercício de liberdades econômicas, capacidade de apropriação privada
sobre bens, a liberdade ambulatória, privacidade e intimidade, todas
representam liberdades que dependem, em última análise, de infraestruturas que
requerem a intervenção pública, dependendo de sua pré-existência o acesso ou o
usufruto dos bens e das liberdades referidas.
Portanto,
se a despesa pública poderia estabelecer relações muito estreitas com os
direitos a prestações ou com uma realidade prestacional dos direitos
fundamentais, seria mais correto admitir sua aproximação com uma dimensão mais
alargada da ação pública: a das políticas públicas, das quais dependem todas as
liberdades civis, sociais, econômicas e culturais do homem, nas sociedades
contemporâneas.
A despesa
pública representa o resultado de um processo de decisão, sendo, portanto, uma
ação consequencial. As transformações no plano existencial devem atender uma
finalidade última, expressa no desenvolvimento de padrões mínimos de dignidade
de vida, permitindo, portanto, que liberdades e a igualdade caminhem de forma
simétrica. Cumpre ao Estado assegurar que o exercício das liberdades não
reproduza privilégios ou estados de discriminação sem causa razoável. A
proteção das liberdades pelo Estado também supõe a proteção da igualdade. Isto
significa que, se a abstenção do Estado não é suficiente para que as liberdades
sejam fruíveis, uma vez que lhe cabe viabilizar a pré-existência da
infraestrutura indispensável à grande parte das liberdades, também se exige
que, por sua iniciativa, a igualdade seja atingida ao mesmo tempo em que se
assegura a proteção das liberdades.
Sendo
assim, seria possível argumentar que o resultado da atividade financeira
destina-se a permitir que todos possam ter igual acesso ao bem-estar decorrente
de serviços públicos, ou de ações que viabilizem o exercício de direitos
fundamentais.
Entretanto,
em que medida isso pode ser viabilizado? Sendo mais específico: igual proteção
supõe que se tenha de proporcionar a todos, os mesmos níveis de proteção?
As
demandas existenciais são iguais? Se não o são, como conciliar estas distinções
e diferenciações, sob o ângulo do princípio da igualdade, que deve ser atingido
através da atividade financeira?
Em
primeiro lugar, deve-se enfatizar que não é verdadeiro que todos possuam as
mesmas necessidades de proteção. Grupos ou sujeitos podem se encontrar expostos
a maiores graus de vulnerabilidade econômica, social e a um conjunto
indeterminado de ameaças existenciais, razão pela qual estas necessidades
especiais suscitam níveis de proteção diferenciados, níveis adicionais de
proteção por iniciativa estatal e que também implicam fontes de financiamento
público especiais (v.g, algumas contribuições especiais).
Portanto,
igual proteção também envolve um dever estatal de proteção ativa do homem e de
suas liberdades, dever que compreende a correção de distorções e falhas de
mercado, v.g, de modo a permitir que sob a referência de um mínimo existencial,
todos possam ter acesso a um nível considerado como satisfatório à sua
existência com dignidade (que não se adstringe à mera sobrevivência) nas
sociedades contemporâneas.
Sob a
referência de um nível mínimo de proteção que deve ser proporcionado de forma
indeterminada e universal a todos os particulares nas sociedades
contemporâneas, é possível viabilizar a compreensão adequada do princípio da
igualdade como meta da atividade financeira do Estado. Proporcionar igual
acesso aos direitos fundamentais é compatível com a admissão de necessidades
especiais e níveis adicionais de proteção, cujo fundamento reside justamente na
correção de distorções ou desigualdades, necessária para que se atinja o nível
mínimo esperado ou admitido como tarefa por determinada experiência jurídica. É
este nível mínimo que orienta a definição do conteúdo do princípio da
igualdade. E concretizar tais níveis de proteção implica, em última análise, a
realização de despesas públicas.
IMPORTANTE: O uso racional dos recursos públicos reflete a correta
(e suficiente) destinação do resultado da arrecadação em ações que sejam
necessárias. Por outro lado, a eficiência na realização da despesa pública
representa a prevenção de gastos desnecessários e a melhoria (potencial) na
capacidade estatal de atender às ações de interesse público.
Com estas
considerações, enfatiza-se que o objetivo central desta proposta de abordagem
sobre a organização da atividade financeira do Estado é, em última análise, o
de expor como estes elementos, receita e despesa, relacionam-se, influenciam,
viabilizam, ou são capazes de viabilizar a ação pública.
Portanto,
nesta abordagem, o Direito financeiro assegura uma possibilidade de se
visualizar, a partir da lei n. 4.320/1964, da LC n. 101/200, e da CRFB, e
através dos elementos receita, despesa, e dos instrumentos definidos pela ordem
jurídica, alternativas e os meios para transformar/concretizar tarefas estatais
de proteção. É a partir da relação, da combinação e da interação entre desses
instrumentos, que se pode assegurar ou viabilizar níveis de proteção social
suficientes, e de benefícios que sejam fruíveis por toda a coletividade.
1.
A despesa
pública. Conceitos.
Para alcançar seus objetivos, o Estado depende de recursos que são
auferidos de diversas maneiras, conforme estudado, constituindo estes recursos,
receita pública, pública porque se trata de dinheiro que ingressa e se destina
ao Poder Público, para o atendimento de finalidades públicas. Tal receita (o
dinheiro) deve ser aplicada para a consecução dos fins previamente traçados,
que passam a constituir deveres do Estado. Os gastos provenientes desta
aplicação dos recursos (receita) constituem o que se trata por DESPESA PÚBLICA.
Como se pode conceituar despesa pública? Basicamente de duas formas:
Conceito sintético: Pelo
primeiro conceito, despesa pública é o conjunto de dispêndios do Estado, ou de
qualquer pessoa de Direito público, mas são gastos necessários para o funcionamento
dos serviços públicos (estes gastos serão despesas correntes,
conforme será visto). Portanto, temos aqui, enquanto síntese, o conjunto de
gastos efetuado pelo Estado para a execução de tarefas públicas, e nada mais.
Conceito analítico: Pelo
segundo conceito, despesa é a aplicação de uma certa quantia (sempre que se
fala em quantia, está se falando em dinheiro. Por que se fala em dinheiro?
Lembrem-se que receita é dinheiro obtido pelo Estado. Portanto, receita é a
aplicação desse dinheiro que foi arrecadado). Quem aplica o dinheiro? A
autoridade ou o agente público. Como aplica o dinheiro? Aplicação é gasto, e todo
gasto deve ser precedido de autorização decorrente de lei. Não se gasta sem uma
lei que autorize o gasto. Aqui já temos um primeiro elemento relevante para o
conceito de despesa: os gastos não são e não podem ser arbitrários. O poder
público não gasta como o particular. Ele só gasta se há autorização para
gastar. Esta autorização, conforme será visto posteriormente, está em uma estrutura
de leis orçamentárias (isso porque o orçamento é o conjunto de um Plano Plurianual-PPA,
de uma Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e de uma Lei Orçamentária
Anual-LOA). Esse conceito, além de mais detalhado, é fiel ao que está exposto
na Lei n. 4320/64 e na estrutura orçamentária da Constituição brasileira.
Temos, em síntese: despesa é toda aplicação de dinheiro para
a execução de alguma tarefa ou atividade pública (atividade executada pelo
próprio poder público). Lembrem-se sempre que atividade financeira é estatal.
Trata-se de dinheiro arrecadado pelo Estado, para ser gasto pelo
Estado, em finalidades de Estado, e nada mais. Mas temos mais elementos
desse conceito: a tarefa pública ou finalidade pública é e deve ser sempre, uma
atividade prevista e programada. Onde está essa programação? Está na estrutura
orçamentária.
Portanto: Todas
aquelas fontes de receitas, ou melhor, o produto daquelas fontes de receita
devem ser aplicados e convertidos em quê?
Em
despesas públicas, que são exatamente os gastos com prioridades ou necessidades
públicas, definidas de forma participativa, em um processo de decisão no qual a
escolha não é o resultado de uma opção plenamente livre e individual do chefe
do executivo. Não quer dizer que um presidente de bairro dirá ao prefeito que
precisa de uma unidade de saúde, a pavimentação de uma via em seu bairro, a
instalação de pontos de iluminação pública, a ampliação de uma rede de
tratamento de esgotos, a construção de creches, o aumento do número de
servidores visando à melhoria do atendimento. As necessidades têm
sede constitucional. As prioridades são escolhas do chefe do poder
executivo, mas somente após considerar os resultados de audiências públicas em
um processo conhecido como orçamento participativo. Algumas prioridades são
pré-fixadas pela Constituição, como despesas com saúde e educação. Nestas, não
cabe ao prefeito, ao governador ou ao presidente da república apontar quanto
pretende ou precisa gastar. A Constituição aponta quanto DEVEM gastar com tais
tarefas.
Neste
caso, temos, por exemplo, em relação à SAÚDE, que as despesas provêm dos
recursos das contribuições da seguridade social do artigo 195 e de outras
fontes (conforme consta do artigo 198, § 1º) e terão percentuais mínimos que
terão de ser obrigatoriamente aplicados anualmente, pela União, Estados,
Distrito federal e municípios (conforme consta do artigo 198, § 2º).
Em relação às despesas com as ações de ensino, o artigo 212, caput,
da CRFB aponta que devem ser aplicados por cada um dos entes da federação, os
seguinte percentuais oriundos do total dos IMPOSTOS arrecadados:
a) 18% no caso da União;
b) 25% no caso dos Estados, Distrito-federal e municípios;
IMPORTANTE: As despesas são públicas não só porque se
utilizam de recursos públicos (receitas públicas). Despesas realizadas pelo
Poder público que não atendam às vedações orçamentárias fixadas pela
Constituição no artigo 167 (que serão analisadas em aula específica), aos
princípios constitucionais da Administração Pública [artigo 37, que propõe os
princípios da legalidade, impessoalidade, publicidade, moralidade e eficiência]
e, especialmente, às regras que orientam a realização das despesas, fixadas na
própria Lei n. 4.320/64 e na Lei de Responsabilidade Fiscal (LC n. 101/2000),
não podem ser autorizadas, devendo ser objeto de sua invalidação e apuração das
responsabilidades dos gestores públicos.
Em síntese, a despesa pública deve ser sempre, além de legal,
uma despesa, necessária, útil, moral e, principalmente, eficiente.
Sendo assim, tomemos como exemplos as seguintes situações:
a) A substituição de TODOS os equipamentos de iluminação pública de um
município, por NOVOS equipamentos, sem a demonstração de melhoria na eficiência
energética dos novos equipamentos que pudesse justificar o gasto;
b) A aquisição de um helicóptero para a finalidade exclusiva de
assegurar a locomoção de chefe do Poder executivo no perímetro urbano e em
viagens de curta duração.
O que temos enfatizado nestes exemplos para a finalidade de uma reflexão
sobre uma definição de despesa? A importância do elemento qualitativo sobre as
escolhas que serão realizadas, para o fim de orientar a tomada de uma decisão
sobre as prioridades. Quem realiza estas escolhas e possui posição preferencial
para a definição das necessidades que poderão ser atendidas pela ação pública,
em um contexto de escassez de recursos? Os chefes dos poderes executivo,
municipal, estadual e federal.
Sendo assim, despesa pública poderia ser definida, EM SÍNTESE, como o
atendimento no plano da realidade, de uma finalidade de interesse público
previamente definida em um plano, a LOA, que por sua vez, representa o
resultado de um arranjo organizado de planos que traçam diretrizes, objetivos e
metas, no sentido de assegurar e viabilizar a seleção das despesas e das fontes
de financiamento disponíveis ou à disposição do Poder Público.
Por outro lado, despesa representa, concretamente, proteção social, e o
resultado das escolhas realizadas pelo Poder Executivo, ao definir as
prioridades no âmbito do orçamento público, expõe para o Poder Legislativo, um
programa contendo um determinado grau ou nível de proteção social que aquele
gestor propõe para um determinado interstício temporal (um exercício
financeiro, no caso da LOA, ou todo o mandato, no caso dos PPAs, conforme será
analisado com detalhamento, posteriormente).
2.
A apuração
da despesa.
O que significa apuração da despesa? Quando se fala em apurar uma
despesa, está se falando em um processo que começa na aquisição de recursos e
termina em sua destinação para uma finalidade pública previamente assinalada
pela Constituição (existem determinadas despesas que já são apontadas
expressamente pela ordem constitucional. Não há liberdade para se decidir se o
gasto vai ou não vai ser realizado nessa matéria, ou ainda, em que medida o
gasto vai ser realizado. Exemplos: despesas com saúde e educação).
No entanto, apesar de o processo de destinação ser jurídico, tendo suas
diretrizes impostas pelo Direito, a decisão de como o dinheiro será gasto, isto
é, o que será priorizado, é uma decisão política.
3.
A
classificação das despesas.
3.1 A despesa na classificação doutrinária:
a) Despesas Ordinárias e extraordinárias: o critério utilizado aqui é o da PERIODICIDADE. Despesas
ordinárias são as despesas que sempre estão apontadas no orçamento ano
a ano. Estão, porque tais gastos são destinados a fazer o custeio de atividades
e tarefas ordinárias do Estado, da execução de tarefas que não podem deixar de
ser oferecidas e executadas pelos poderes públicos todos os anos. Fazem o uso
de recursos ordinários (receitas ordinárias). Despesas Extraordinárias são
despesas que decorrem de atividades ou tarefas extraordinárias, que NEM SEMPRE
têm que ser realizadas. Estão sustentadas, portanto, em receitas
extraordinárias. Receitas que não decorrem de atividade regular de obtenção de
recursos; receitas extraordinárias;
b) Despesas federais, estaduais e municipais: o critério aqui é o da COMPETÊNCIA constitucional.
Despesas federais são as despesas decorrentes das tarefas da União. Quais são
elas? Aquelas traçadas no artigo 21 da Constituição Federal. O
mesmo se verifica com as despesas estaduais e as municipais. As estaduais são
aquelas decorrentes das tarefas indicadas no artigo 25. São despesas residuais.
Todos já devem ter verificado ou o farão, mas a técnica de distribuição das
competências no Estado Federal Brasileiro concentra poderes na União (poderes
enumerados são da União) e reserva as residuais aos Estados. Os municípios
possuem competências expressas e são aquelas do artigo 30. O critério é frágil,
porque há despesas que NÃO SÃO EXCLUSIVAS de qualquer um dos entes. Temos
competências comuns, que estão no artigo 23 (competências administrativas).
Aqui todos atuam de forma cooperativa. As despesas são repartidas entre vários
entes. Não vamos entrar em detalhes neste momento por ser matéria de análise do
Direito constitucional. O que interessa nesta oportunidade é fixar que o
critério é frágil porque a ordem constitucional admite despesas realizadas em
comum pelos entes da federação. Portanto, não temos APENAS despesas exclusivas
de um ou de outro ente da federação;
c) Despesas produtivas, reprodutivas ou improdutivas: aqui o critério é o da FINALIDADE das despesas. Nessa
leitura, temos as despesas PRODUTIVAS, que se limitam a criar utilidades
ATRAVÉS DA ATUAÇÃO ESTATAL. Exemplos desta classificação são as despesas
relacionadas à atividade policial e jurisdicional. As REPRODUTIVAS implicam em
AUMENTAR A CAPACIDADE DE PRODUÇÃO. Temos aqui despesas com a construção de
escolas, estradas, hidrelétricas. As despesas IMPRODUTIVAS estão relacionadas a
despesas que não correspondem a qualquer utilidade. O principal exemplo aqui é
o gasto despendido pela União, Estados, Distrito-federal e municípios, com a manutenção
de obras abandonadas.
A crítica aqui se dirige para o que se entende pela referência semântica
de utilidade. O que não há, de fato, é a conversão desses gastos com
comodidades para a coletividade. Mas sendo gasto público, não se pode
considerar inútil. Todo gasto se faz porque foi autorizado por lei e porque
possui uma finalidade programada antecipadamente. Entretanto,
nem todo gasto atende a utilidades ou comodidades para a coletividade. Neste
sentido, e somente neste sentido, uma determinada despesa não poderia ser
considerada útil, porque toda despesa cumpre uma finalidade. Não fosse assim,
não se teria despesa pública.
d) Despesa-compra e despesa-transferência: O critério aqui é o ECONÔMICO. A primeira é aquela
realizada para a aquisição de produtos ou de serviços (exemplos são o pagamento
da folha de vencimentos dos servidores públicos, e a aquisição de bens de
consumo). A segunda é aquela que não corresponde a aplicação governamental
direta, limitando-se a criar rendimentos aos indivíduos, sem qualquer
contraprestação destes (subvenções, subsídios e quaisquer outras formas de
auxílio financeiro). Temos aqui a simples transferência de poder de
comprar para o particular, nada adquirindo. Tal critério, além de não
possuir rigor técnico, não nos é relevante, vez que é baseado na ciência
econômica, assunto que não diz respeito ao nosso objeto, que deve ser jurídico.
3.2 Na Lei n. 4.320/64:
a) Despesas correntes e despesas de capital: este é o critério da Lei n. 4.320/64, reproduzido no texto de seu artigo
12, sendo este o critério JURÍDICO de classificação das despesas.
Despesas Correntes são as
despesas que abrangem o CUSTEIO e as TRANSFERÊNCIAS CORRENTES, representando as
despesas vinculadas à manutenção da ação pública.
Ø Entende-se por CUSTEIO: as dotações (vamos definir o que sejam dotações)
para manutenção de serviços já criados, inclusive as destinadas a atender obras
de conservação e adaptação de bens imóveis (art. 12, § 1º), abrangendo o
custeio de pessoal, material de consumo, serviços em geral e encargos diversos;
Ø As TRANSFERÊNCIAS CORRENTES são dotações reservadas para despesas que
não decorrem de uma contraprestação direta em bens ou serviços, incluídas aqui
as despesas para contribuições e subvenções para atender outras entidades de
direito público ou privado (art. 12, § 2º). Aqui temos as subvenções para o
custeio dos proventos de aposentadoria dos servidores inativos, pensionistas, o
salário-família, contribuições da previdência social e outras, e os JUROS DA
DÍVIDA PÚBLICA.
As despesas de capital abrangem INVESTIMENTOS,
INVERSÕES FINANCEIRAS E TRANSFERÊNCIAS DE CAPITAL, compreendendo aquelas
vinculadas ao aperfeiçoamento da ação pública.
Ø Em primeiro lugar temos os INVESTIMENTOS, que correspondem às aplicações
para o planejamento e execução de obras, equipamentos, instalações, material
permanente, constituição ou aumento de capital de empresas ou entidades
INDUSTRIAIS OU AGRÍCOLAS (art. 12, § 4º).
Ø AS INVERSÕES FINANCEIRAS (art. 12, § 5º) são as dotações
destinadas à AQUISIÇÃO de imóveis, participação em aumento ou constituição de
capital de empresas ou entidades COMERCIAIS OU FINANCEIRAS, aquisição de
títulos representativos de capital de empresas em funcionamento, constituição
de fundos rotativos, CONCESSÃO de empréstimos e diversos);
Ø AS TRANSFERÊNCIAS DE CAPITAL abrangem as dotações para INVESTIMENTOS ou
INVERSÕES FINANCERIAS que OUTRAS pessoas de direito público ou privado devam
realizar, independente de contraprestação direta em bens ou serviços, bem como
as dotações para AMORTIZAÇÃO da dívida pública (amortização da dívida pública,
auxílio para obras públicas, auxílio para equipamentos e instalações, AUXÍLIOS
para inversões financeiras e outras contribuições) (art. 12, § 6º);
4.
Elementos e
execução das despesas públicas.
No setor público, ao contrário do privado, no qual os objetivos devem
ser adaptados aos recursos existentes, primeiro se elegem as prioridades da
ação governamental, para depois se identificar quais serão os meios de obtenção
dos recursos.
A tomada dessas decisões representa escolhas de conteúdo político, na
qual são eleitas prioridades em uma margem de liberdade controlada, pois há
limites fixados pela lei (leis orçamentárias). De outro modo, essas decisões se
convertem em despesas segundo um encadeamento de atos conjugados, cuja
finalidade última é o atendimento de demandas de interesse público e a
satisfação dos interesses de uma universalidade, através da realização de
despesas.
Sendo assim, não se realiza gasto público de forma livre, unilateral ou
arbitrária, segundo as opções do chefe do Poder Executivo. Nesses termos, as
despesas devem estar, primeiro, previstas e autorizadas em leis orçamentárias
aprovadas pelos parlamentos, e, posteriormente, devem atender a um procedimento
do qual depende sua realização, abrangendo o ato de seu surgimento até o ato de
seu pagamento.
Muito embora este seja um tema que terá seu lugar próprio em nosso
programa, alguns destes elementos já podem ser objeto de explicitação para o
fim de permitir melhor compreensão do lugar da despesa pública nesse processo,
que compreende um conjunto de ações coordenadas de planejamento.
5.
Os
orçamentos.
Apenas a título de informação para facilitar o entendimento do conteúdo,
já que tal assunto será estudado com maior detalhamento em aulas
posteriores, o orçamento é, em suma, o instrumento que contém a
aprovação prévia da receita e da despesa para um período determinado. O
procedimento de DEFINIÇÃO de uma despesa no âmbito de UM orçamento (já que
temos pelo artigo 165, § 5º, incisos I, II e III, três orçamentos: o fiscal, o
de investimentos, e o da seguridade social) pode ser definido da seguinte
forma:
1º. Metas e despesas públicas: definem-se
as metas de acordo com a política governamental, levando a definição das
despesas;
2º. Recursos e receita: são apontadas
as fontes dos recursos, as formas de sua obtenção, para o atendimento das
metas.
3º. Aprovação parlamentar: as
despesas devem ser então aprovadas pelo parlamento de cada entidade da
federação, portanto, pelo Congresso Nacional, pelas Assembléias Legislativas, e
pelas Câmaras de Vereadores;
4º. Orçamento anual: com a
aprovação, define-se o orçamento anual (receitas e despesas), que deve
estabelecer uma relação de conformidade com duas leis anteriores, a lei de
diretrizes orçamentárias e o Plano Plurianual.
5º. Dotações orçamentárias: são as
verbas constantes do orçamento que estão reservadas desde a aprovação da lei
orçamentária, para a realização de uma determinada finalidade pública.
6.
A
discriminação da despesa na lei orçamentária
O que são dotações? Dotação orçamentária (ou verba orçamentária) é o
recurso fixado no orçamento para atender às necessidades de uma despesa, de um
órgão de Estado ou de um fundo.
Dotação é, portanto, uma parcela do crédito orçamentário que foi fixado
para atender a um programa de governo, vinculada a um elemento de despesa.
IMPORTANTE: Conforme orientam os artigos 14 e 15 da Lei n. 4.320/64, a despesa
deve ser discriminada por elementos, em cada unidades administrativa ou órgão
de governo.
Elementos são desdobramentos da despesa, que devem ser vinculados a cada
órgão ou unidade da Administração, tendo-se, por exemplo: pessoal, material,
serviços, obras, ou qualquer outro meio que seja necessário para a realização
de tarefas públicas pelo Estado.
7.
Alguns requisitos
para a realização das despesas.
Em primeiro lugar, conforme os incisos I e II, do art. 167, o texto
constitucional veda que qualquer despesa seja realizada sem a prévia previsão
orçamentária.
Temos, portanto, que a primeira condição para a realização de qualquer
despesa é sua previsão na lei orçamentária anual, que é, por sua vez, a
conseqüência de duas outras leis de programação. Não se gasta sem previsão
legal, e não há despesa incompatível com a LDO e o PPA. Entre estes planos deve
existir uma relação de compatibilidade vertical.
Não se quer dizer com isso que TODOS os gastos devam ser programados e
que não seria possível realizar gastos não previstos. O orçamento é um
instrumento de planejamento, de planificação, mas nem todas as ações de Estado
podem ser planejadas ou previstas oportunamente. Existem tarefas excepcionais,
extraordinárias que podem justificar que, mesmo não previstos, programados e
planejados, gastos possam ser realizados.
De que exceções estamos tratando? Dos créditos especiais,
extraordinários e suplementares, tratados pela lei n. 4320/64 como créditos
ADICIONAIS. Estes créditos veiculam o gênero, de onde as espécies são os
especiais, os extraordinários e os suplementares.
O que são créditos? Crédito orçamentário é toda DOTAÇÃO incluída no
orçamento para atender a qualquer despesa do Estado. Se este crédito é
insuficiente ou simplesmente não existe na lei orçamentária anual (porque a
despesa não pôde ser prevista), créditos adicionais terão de ser ABERTOS,
conforme a finalidade de tais despesas, nos termos do artigo 41, da Lei n.
4.320/64.
8.
Os créditos
adicionais
Estamos tratando aqui de dotações além das já previstas e reservadas em
um orçamento aprovado pelo parlamento. Se o crédito for insuficiente ou não
existir (porque a despesa sequer poderia ser prevista) poderão ser AUTORIZADOS
créditos ADICIONAIS.
Conforme prevê o artigo 41, inciso I, da Lei n. 4.320/64, créditos
SUPLEMENTARES são os destinados ao REFORÇO de dotação que JÁ EXISTE. Também
estão previstos no artigo 165, § 8º e 167, inciso V, da CRFB.
Créditos ESPECIAIS são aqueles destinados para despesas que não possuem
qualquer dotação orçamentária específica, conforme definido pelo artigo 41,
inciso II e pelo artigo 167, §§ 2º e 3º, da CRFB.
Créditos EXTRAORDINÁRIOS são os destinados ao atendimento de despesas
que não existem e não foram previstas porque SEQUER poderiam ser previstas.
Temos aqui as despesas decorrentes de ações urgentes e imprevistas, como
guerra, comoção e calamidade pública, sendo previstas no artigo 41, inciso III,
da Lei n. 4.320/64 e pelo artigo 167, §§ 2º e 3º, da CRFB.
Tomemos alguns exemplos para ilustrar com mais clareza a hipótese
específica a requrer cada modalidade de crédito:
a) Créditos suplementares: O Estado deve cumprir liminares para o
fim de proporcionar acesso de alguns pacientes a medicamentos de alto custo.
Como o Estado cumprirá esta ordem judicial? O custeio da despesa que será
gerada será financiada pela abertura de crédito suplementar, uma vez que se
trata de ação ordinária do Poder Público, prevista e programada na LOA. O
programa para aquisição de medicamentos de alto custo existe, mas não há
recursos suficientes para o financiamento das ações requeridas, as quais
suscitam níveis de proteção adicionais àqueles previstos inicialmente na lei
orçamentária anual. O mesmo ocorre com o custeio das ações de saúde em razão de
epidemias. A aquisição de medicamentos suficientes para atendê-la supõe
créditos suplementares, mas edificações, contratações temporárias supõem
créditos extraordinários. Não se verifica a hipótese de créditos especiais,
porque há aqui a visibilidade da urgência e da imprevisibilidade e,
possivelmente, de hipótese de calamidade pública;
b) Créditos especiais: O Estado realizou concurso público para o
provimento de cargos de defensor público, mas não nomeia os defensores neste
ano, pretendendo fazê-lo apenas no próximo ano. Portanto, não há previsão
orçamentária na LOA atual para a nomeação de defensores. Entretanto, o MP
estadual ingressa com ACP requerendo que seja instalada a Defensoria na comarca
de Colniza, diante da gravidade dos conflitos sociais e fundiários vivenciados
pela população local. Como o Estado cumprirá esta ordem? Mediante a abertura de
créditos especiais, uma vez que não há dotação para tal finalidade na LOA
vigente, em razão de se pretender fazê-lo apenas no próximo exercício
financeiro. O mesmo ocorre para o cumprimento de decisões judiciais que exigem
a construção de creches, unidades de delegacias, instalação de estação de
tratamento de resíduos em cadeia pública, pavimentação ou duplicação de vias
públicas para o fim de ser reduzir a mortalidade nas estradas;
c) Créditos extraordinários: Catástrofes ou eventos que, diante de
sua imprevisibilidade, requerem ação emergencial para sua remoção. Podem ser
citados os desabamentos, enchentes e deslizamentos, a exigir intervenção no
âmbito do financiamento público, através de créditos extraordinários. Despesas
extraordinárias os requerem.
EM SÍNTESE: Toda despesa representa um ato vinculado e um ato consequencial. Não
propõe, portanto, uma escolha plenamente livre, nem tampouco propõe uma
possibilidade de atender a qualquer finalidade, assim como também não propõe
ato do qual não resulte qualquer utilidade no plano de vantagens e benefícios
universais (serviços públicos, prestações sociais, etc...). Sendo assim, se uma
despesa representa um ato que somente pode ser praticado se pré-existente uma
autorização legal, que deve expor a finalidade que deve ser atingida (os
programas, ações e projetos relacionados na LOA aprovada pelo parlamento), os
créditos adicionais propõem uma realidade na qual o uso dos recursos públicos
somente será admitido se expuser o atendimento de uma finalidade previamente
fixada, que foi objeto da consideração do parlamento, anuindo ou modificando a
proposta inicialmente submetida pelo chefe do Poder Executivo.
Programado o conjunto de finalidades que pretende atingir em um
interstício temporal determinado, se pretende realizar despesa não prevista
inicialmente, estamos diante de duas realidades: a) a programação não previu a
nova despesa que pretende ser realizada (uma obra pública, uma pista de boliche
para associação privada, ou ainda, a aquisição de um helicóptero para facilitar
a mobilidade urbana do chefe do Poder Executivo) e o gestor, dispondo de
recursos, anula despesa para atendê-la. Aqui, faz-se o uso, portanto, de
recursos que ainda estão ao alcance do próprio chefe do Poder Executivo.
Créditos orçamentários, mas de forma distinta das finalidades aprovadas pelo
parlamento. Neste caso, será possível expor situações de défice de recursos
para a proteção de algumas finalidades de interesse social prioritárioas.
Diante da carência, a correção desta distorção na decisão sobre alocação
orçamentária poderia ser realizada mediante intervenção judicial. Não se
trataria aqui de interferência não autorizada sob a margem de livre apreciação
reservada ao chefe do Poder Executivo, ou à separação funcional do poder
político. Também não se teria um quadro pelo qual o Poder Judiciário exigiria
do Estado mais do que pode oferecer, senão de uma intervenção que visa corrigir
a distorção no processo de decisão, para o fim de assegurar o maior equilíbrio
possível na distribuição dos benefícios.
b) O gestor não mais dispõe de recursos e os requer para o fim de
atender à nova despesa. Neste cenário, uma vez que os recursos não estão ao seu
alcance, deverá solicitar ao parlamento autorização para fazer o uso de
recursos de excesso de arrecadação, superávit financeiro ou anular uma despesa.
Caberia ao parlamento o exercício de função de controle sobre as razões de
justificação expostas pelo Poder Executivo. Se houve a aprovação da LOA,
considera-se que teria sido realizada a programação sobre todo o conjunto de
prioridades indispensáveis à ação pública naquele interstício temporal. Sendo
assim, porque razão se estaria exigindo mais recursos? O que pretende atingir
com estes recursos? Este teria de ser o conjunto de questões fixadas pelo juízo
de controle, realizado no âmbito do parlamento, pois lhe cabe, após o exercício
deste juízo, permitir o acesso do chefe do poder executivo a recursos que
poderiam, em princípio, estar vinculados a outras despesas (no caso da anulação
da despesa);
Qual é a fonte de tais créditos? Qual é a origem dos recursos para a execução
dessas despesas que não foram contempladas previamente na lei orçamentária?
Só podem ter origem em SUPERÁVIT FINANCEIRO, EXCESSO DE ARRECADAÇÃO e
ANULAÇÃO DE DOTAÇÃO ORÇAMENTÁRIA (artigo 43, Lei n. 4.320/64).
Em relação aos créditos EXTRAORDINÁRIOS, sua autorização decorre
de Medida Provisória (artigo 167, § 3º, CRFB).
Todo crédito adicional também depende de autorização legislativa,
conforme prevê o artigo 167, inciso V, bem como, da indicação da fonte de
recurso responsável por seu custeio.
Portanto, na hipótese em que uma determinada despesa não tenha sido
prevista pela lei orçamentária, poderá ser realizada desde que sejam
AUTORIZADOS créditos adicionais. A autorização é legislativa e a lei que
AUTORIZAR a ABERTURA desses créditos, já deve INDICAR as FONTES dos recursos.
SÍNTESE: Podemos compreender os créditos adicionais sob a perspectiva de que as
tarefas estatais que proponham proteção social supõem que esta proteção (cujos
níveis são variáveis) dependem e decorrem necessariamente do grau de
disponibilidade de recursos públicos. O nível de proteção que se pretende
atingir, portanto, decorre e expõe estreita vinculação com a capacidade
financeira do Estado. Quando o Estado não é capaz de assegurar a satisfação de
necessidades básicas de uma universalidade, seja porque as instituições não
podem proporcionar proteção suficiente, ou porque se verifica a ausência
institucional, temos exposto o contexto de consideração dos créditos
adicionais. Estes níveis de proteção social, ou esta proteção social dependem
da identificação de fontes capazes de assegurá-los.
Duas são as causas capazes de justificar tais cenários de insuficiência
ou ausência de proteção, que não foi possível de ser atingida pelo uso dos
recursos disponíveis: a) a exaustão dos recursos orçamentários programados para
o financiamento das despesas previstas e estimadas, ou, ainda, a hipótese de
calamidade, que expõe cenário de ausência das instituições, ou de instituições
incapazes de assegurar proteção porque foram atingidas por eventos
imprevisíveis. Sob semelhante perspectiva de urgência, eventos de tal natureza
justificam que os obstáculos sejam removidos ou superados com celeridade. Esta
celeridade, entretanto, não imuniza o Poder Executivo da obrigação de requerer
autorização legislativa e que aponte as fontes de recursos que proporcionarão o
financiamento das despesas necessárias, que representam, em última análise,
níveis de proteção adicional, ou proteção mínima que não foi atingida
adequadamente pelo Estado, mesmo a partir do uso dos recursos disponíveis, seja
porque riscos adicionais e imprevisíveis modificaram a programação originária,
prejudicando os níveis mínimos programados e apontando níveis reforçados, seja
porque riscos adicionais à proteção social, mas perfeitamente previsíveis,
igualmente modificam a programação originária, requerendo ação adicional por
iniciativa do Estado.
9.
Outros
aspectos relevantes para a realização das despesas, e que devem ser
mencionados:
· a proibição de transposição, o remanejamento ou a transferência
de recursos de uma categoria de programação para outra ou de um órgão para
outro, sem prévia autorização legislativa, que consta do artigo 167, inciso VI;
· A proibição de concessão ou de autorização de créditos
ILIMITADOS, que consta do artigo 167, inciso VII;
Como regra geral NÃO É POSSÍVEL vincular receitas de IMPOSTOS a qualquer
despesa de órgão ou entidade da Administração Pública, conforme já tivemos a
oportunidade de examinar (artigo 167, inciso IV, primeira parte).
Isso quer dizer que todas as receitas auferidas pelo Estado decorrentes
da arrecadação de IMPOSTOS atendem a um conjunto indeterminado de ações e
atividades, sem que sejam destinadas a qualquer ação ou tarefa específica, que
tenha de ser realizada pelo Estado.
No entanto há cinco exceções a essa regra geral,
impostas pela Constituição, expressas no próprio inciso IV, do art. 167, sendo
as duas primeiras as mais relevantes para a nossa análise e que já foram
mencionadas em aulas anteriores:
Ø em relação à despesa com o ensino: na forma do art.
212, caput, da CF “a União aplicará, anualmente, nunca menos de
18, e os Estados, Distrito Federal e Municípios 25%, no mínimo, da receita
resultante de impostos, compreendida a proveniente de transferência, na
manutenção e desenvolvimento do ensino”.
Ø em relação à despesa para o financiamento da saúde: na
forma do § 2º do art. 198.
Ø em relação à despesa para a realização de atividades da
administração tributária: na forma do inciso XXII, do art. 37.
Ø em relação a prestação de garantia às operações de crédito por
antecipação de receita: previstas no art.165, § 8º e no § 4º do
próprio art. 167.
Ø em relação a repartição do produto da arrecadação dos impostos
pertencentes aos Municípios no art. 158, e os que a União deve entregar conforme
o art. 159;
Dessa forma, qual é a conseqüência da vinculação a essas despesas, para
o efeito de realização do conjunto de despesas pelo Estado?
Estas despesas e, principalmente, aquelas vinculadas às ações de ensino
e saúde, por serem vinculadas, devem ser as primeiras realizadas. Em seguida, o
administrador deve efetuar o pagamento das despesas legais (como a remuneração
dos servidores públicos), assim como o serviço da dívida pública, que não pode
ser contingenciado. De outro modo, também deve prever o pagamento dos serviços
públicos e efetuá-los.
Por conta da imposição de que o pagamento de todas estas despesas
obrigatórias (vinculada, legal, serviço da dívida, previsão orçamentária dos
serviços públicos) seja prévio e deva preceder qualquer outro gasto, tem-se,
com clareza, restrições e variações à capacidade de se realizar despesas com
investimentos pelo Poder Público, situação que reforça a necessidade da
responsabilidade do chefe do poder executivo, na escolha de suas prioridades.
SÍNTESE REFLEXIVA:
O desperdício de recursos financeiros é nocivo ao interesse público,
porque contribui, decisivamente, para que demandas existenciais não sejam
atendidas ou o sejam de forma deficiente ou insuficiente.
Quando o gestor escolhe mal, destina mal os recursos que estão ao seu
alcance, realiza despesas desnecessárias, que não consigam proporcionar os
resultados úteis, ou, ainda, que não consigam proporcionar os resultados do
modo mais econômico ou mais eficiente, estar-se-á diante de uma hipótese de
vício na ação administrativa amplamente investigada pelo Direito Público
contemporâneo, denominada, desvio de poder, ou desvio de finalidade (“tresdestinação”).
O gestor que não consegue, por erro, negligência, insuficiência técnica,
ou mesmo dolo, proporcinar uma relação proporcinal e equilibrada entre o que se
pode ter (benefícios existenciais) e o que efetivamente se tem (recursos
financeiros), não exerce a extensão de seus poderes adequadamente.
Conforme é examinado pelo Direito administrativo, o agente público atua
apenas porque o pode e nos limites de uma autorização conferida pela ordem
jurídica. Nesse caso, se no exercício desses poderes, o gestor falha ou não
exerce os poderes com a suficiência requerida perante uma realidade
sócio-econômica determinada, a função pública não foi atendida adequadamente.
Exemplos dessa realidade também podem ser descritos por meio de outros
cenários, como aquele no qual os entes federativos não exploram todas as
receitas tributárias que estão à sua disposição (contribuições de melhoria,
v.g), não exploram as demais receitas que estejam ao seu alcance (receitas
patrimoniais de seus bens imóveis), ou, ainda, quando instrumentos de controle
e proteção do patrimônio público são flexibilizados. Este caso tem seu exemplo
mais concreto na aceleração dos processos de contratação pública em virtude de
obras da Copa do Mundo. A autorização arbitrária de dispensa de licitações para
a execução de obras ou a flexibilização nos controles administrativos em
benefício da celeridade, não favorecem a proteção do interesse público. Isso se
deve em razão de o procedimento licitatório ser a principal garantia de que se
poderá obter a melhor destinação possível e de que se poderá realizar a melhor
escolha possível, de acordo com os recursos financeiros disponíveis.
Visando desenvolver a capacidade de se estabelecer relações sobre o
tema, analisemos os seguintes problemas:
a) o que representa uma decisão pública de postergar a contratação de
agentes públicos responsáveis por fiscalizar o cumprimento de regras
sanitárias, de saúde pública, ambientais, urbanísticas ou mesmo tributárias, de
trânsito e de extenso conjunto de atividades relacionadas ao cotidiano das
sociedades contemporâneas? Ao contrário do que se possa considerar,
possivelmente, uma decisão que postergue esta contratação não representa
economia na geração de despesas correntes, senão uma fonte potencial de
elevação de despesas de diversas ordens. Confira-se o exemplo de agentes
responsáveis por fiscalizar a restrição de tráfego de veículos de elevada
tonelagem nas vias públicas urbanas de determinado município. A ausência de
fiscalização representa, a um só tempo, duas fontes de perda de receita diária.
A primeira, decorrente da arrecadação de multas administrativas que serão
geradas em decorrência do descumprimento da restrição (fonte de receita) e a
segunda, decorrente de despesas adicionais que serão geradas em virtude da
necessidade de reparos frequentes do piso asfáltico, que terá sua destinação
severamente comprometida com a tolerância do acesso dessa modalidade de
veículo. É conveniente ressaltar que, neste caso, a restrição ao tráfego tem
sua justificação no interesse público e a ação de polícia representa, em última
análise, o instrumento que o assegura. Que interesse está envolvido nesta
relação e que demanda proteção? O interesse da coletividade na destinação
eficiente e racional dos recursos públicos disponíveis, para o atendimento
ótimo das demandas e das necessidades prioritárias que se fizerem necessárias,
em um contexto de escassez. Neste caso, o não atendimento das restrições
viárias e a omissão no controle da norma produz um cenário no qual os
responsáveis pelo uso ilegal da via têm acesso a benefícios econômicos privados
decorrentes desta omissão, mas não suportam do mesmo modo os prejuízos gerados
pelo seu descumprimento. O piso asfáltico terá de ser reparado para o fim de
permitir a mobilidade urbana e também para assegurar a própria continuidade
deste aproveitamento, mas os responsáveis por suportar estes efeitos econômicos
não serão aqueles beneficiários, senão toda a coletividade, mediante a
destinação parcial dos recursos dos tributos arrecadados, para atender a esta
finalidade. É visível, portanto, que a racionalização do uso dos recursos
públicos em um contexto de escassez depende da qualidade das escolhas públicas
e de comportamentos privados, decorrendo desta combinação, a capacidade de
melhor atender ao conjunto de necessidades existenciais de uma universalidade
de interessados.
b) A omissão na contratação ou no aperfeiçoamento de ações e de
programas nas leis orçamentárias, que estejam vinculados a políticas públicas
ambientais. A ausência de ações de fiscalização sobre o controle de emissões
atmosféricas, sobre áreas com elevada probabilidade para a produção de focos de
calor, sobre o uso dos solos urbano e rural, sobre a coleta e tratamento de
resíduos sólidos no espaço urbano e a ausência de seu controle, mediante o
exercício da ação de polícia administrativa (aplicação de multas e sua
cobrança, em decorrência das infrações identificadas) compromete a destinação
dos recursos para outras áreas nas quais se verificará aumento na despesa
(saúde, recuperação dos danos em projetos de longo prazo, descontaminação de
solos e de recursos hídricos, custos mais elevados para o saneamento
ambiental). Portanto, a omissão em se prever a implementação de políticas
ambientais resulta na insuficiência (ou na ausência) de fiscalização para o
cumprimento da legislação ambiental (ou sanitária, v.g) e influencia a geração
de despesas que serão suportadas, posteriormente, por toda a coletividade na
forma da destinação de parte da receita tributária para o seu atendimento pelo
Estado.
c) O que representa para o tema despesa pública, um cenário no qual 400
toneladas diárias de resíduos são produzidas e coletadas, independente de
coleta seletiva ou programas públicos que viabilizem acesso à informação e
incentivo para práticas de redução da capacidade de produção de resíduos?
Esgotamento da capacidade de tratamento e destinação, subaproveitamento de
espaços, perda de oportunidade de geração de receita e de diminuição de
despesas com a diminuição do volume coletado e tratado, despesas com transporte
de resíduos, potencial de produção de danos a ensejar a geração de novas
despesas. Neste contexto, não tratar resíduos é uma escolha possível? Se não é,
a escolha dos processos de tratamento dos resíduos, sob o plano da eficiência
(que também requer eficiência e racionalidade orçamentária) requerida pelo
artigo 37, caput, da CRFB, pode ser admitida como uma escolha
plenamente livre ao alcance do gestor público?
Exercícios programados:
· A contratação de mais de 1.000 professores pela Secretaria
Estadual de Saúde para o fim de atender à necessidade emergencial nas unidades
de ensino estaduais em período eleitoral;
· Distinguir três situações para o fim de examinar os créditos
adicionais no contexto da despesa pública: a) a necessidade emergencial de
aquisição de medicamentos de alto custo e as escusas para atrasos em sua
disponibilidade; b) o estado de calamidade pública em municípios nordestinos em
razão de cheias extremas; c) os custos adicionais para as ações públicas no
domínio da saúde, vinculadas ao combate à dengue;
Reflexão
sobre a qualidade das despesas públicas no âmbito da Copa do Mundo, diante dos
procedimentos de dispensa de licitação; Reflexão sobre o tema: “Os custos sociais do exercício da
cidadania.”
Indicações
bibliográficas
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