quarta-feira, 13 de novembro de 2013

AULA 11

Tema: As leis orçamentárias. Funções e conteúdos.

1. Orçamento público, cláusula de progressividade e proibição de retorno nos níveis de proteção dos direitos fundamentais, e nas escolhas e decisões sobre as políticas públicas em matéria de DSEC.

O orçamento reflete uma relação de coordenação que tem na LOA, o momento final de um processo de racionalização das escolhas: a) sobre como os recursos disponíveis poderão, ou serão destinados em um período de quatro anos; b) no contexto das prioridades, metas, programas e, sobretudo; c) de um projeto político e existencial para a sociedade, no interstício vinculado à representação política.
Nessa perspectiva, o orçamento poderia ser exposto como um dos principais instrumentos potencialmente relevantes no processo de concretização do projeto político que é definido por uma determinada ordem constitucional.
Esse projeto é permanente, ou ao menos suscita uma pretensão de estabilidade relativa e condicionada (conforme as normas dos processos de reforma constitucional). Por outro lado, semelhante projeto sujeita os gestores à condição de mediadores com participação transitória e circunstancial em um processo de proteção de direitos fundamentais, dependentes de escolhas de longo prazo.
Sendo assim, o gestor é, tão somente, o responsável por viabilizar, em um determinado interstício, a transformação da realidade, visando assegurar que todos tenham acesso a níveis ou prestações essenciais ao desenvolvimento digno de projetos de vida.
Se o Estado não se vincula ao nível máximo de proteção, que favoreça ou priorize/privilegie demandas particulares ou especializadas em níveis mais elevados (embora necessidades especiais justifiquem tais imperativos em nome de um princípio de isonomia), encontra-se por outro lado, vinculado a um dever de assegurar o acesso universal e isonômico, àquelas prestações, e aos níveis que sejam essenciais ou elementares para que, cada membro da comunidade, tenha condições para usufruir de um projeto digno de vida, por meio de suas próprias escolhas.
Por essas razões, e tendo-se em consideração que os DSEC (direitos sociais, econômicos e culturais) não podem ser concretizados instantaneamente, além do fato de que distintas escolhas podem ser realizadas em um amplo espectro de opções ao alcance do gestor, o dever de proteger direitos fundamentais e o dever de viabilizar o mínimo existencial, condicionam tais escolhas, ao nível de lhe apontar ou restringir suas opções. Estas opções serão limitadas e restritas àquelas que melhor se adaptem ou se identifiquem com os resultados que precisem ser atingidos.
Em caso decidido pela Suprema Corte da África do Sul (Grootboom), v.g, o acesso ao direito à moradia somente pode se converter em realidade isonômica e universal, por meio da consideração de que o mínimo, sob tal perspectiva, somente poderia ser viabilizado a partir da implementação de políticas de financiamento público e de programas de moradia social. Esta opção foi realizada em detrimento de outra, também possível hipoteticamente, mas indisponível sob o plano financeiro (fora do alcance do gestor, portanto), que seria aquela que atribuísse a cada necessitado, uma habitação.
Escolhas (e sua qualidade) realizadas no âmbito de um processo de programação definem, concretamente, a capacidade de se realizar um determinado projeto político, e de concretizar os princípios e deveres estatais que se encontrem fixador por uma ordem constitucional. As chances desse projeto se converter em realidade dependem, em grande medida, da qualidade de tais escolhas.
Distorções podem ocorrer no processo de programação, subtraindo ou ignorando, v.g, um imperativo de progressividade em determinado setor. Quando estas ocorrem, se ao Estado se encontra atribuído um dever de proteger e desenvolver direitos fundamentais, a falha na proteção por meio das escolhas do Executivo justifica um imperativo de proteção por iniciativa das demais funções estatais, visando corrigir deficiências em determinada política pública, ou, v.g, corrigir distorções regionais na implementação de determinada política pública.
É o que ocorre, v.g, quando: a) recursos são destinados arbitrariamente para o atendimento de pretensões eleitorais em detrimento do dever de programação para o fim de corrigir distorções regionais; b) quando demandas emergenciais no plano do meio ambiente e da saúde, a exigir a elevação nos investimentos e progressividade em seu desenvolvimento, deixem de ser atendidas, e; c) quando investimentos em saneamento ambiental são preteridos em benefício de pavimentação de qualidade duvidosa, tão somente para o fim de demonstrar a pessoalidade de obras públicas e a vinculação publicitária de tais obras a um determinado mandato.
Se pudermos estabelecer relações entre a atividade financeira e os princípios de outra disciplina, o Direito Ambiental, poder-se-ia propor que um princípio de sustentabilidade atua exatamente nesse plano, o das escolhas. Estas são prioritárias para o fim de racionalizar os níveis de proteção (e sua intensidade), de acordo com os níveis de comprometimento financeiro que estejam relacionados a tais escolhas e as medidas que tenham sido selecionadas.
Assim é que, quando boas escolhas são realizadas para políticas públicas ambientais, danos são prevenidos e o bem-estar é proporcionado por meio de custos menos elevados. O mesmo não ocorre quando os recursos não são destinados para tais ações, e quando se verifica um número cada vez mais elevado na propositura de ações civis públicas, anualmente, isto expõe, simplesmente, um cenário de diagnóstico, pelo qual, reconhece-se que o Estado falhou, falha, continua falhando, e falhará.
Outro exemplo ainda poderia ser citado. Escolhas equivocadas, incompletas, deficientes, e inadequadas podem comprometer de forma irreversível, a identidade física, espiritual e religiosa de povos indígenas, v.g. Trata-se aqui, do caso de Belo Monte, no qual, integrado ao PAC, e previsto no PPA, verifica-se a escolha em benefício de projeto que se por um lado, favorece a produção energética, desfavorece a proteção de direitos dos povos indígenas, eliminando o vínculo que define sua identidade física, cultural e espiritual, decorrente de suas terras e de seus recursos.
Em detrimento de uma realidade de progressividade, tal cenário evidencia uma realidade de regresso e de retorno, vedados em matéria dos DSEC (direitos sociais, econômicos e culturais), ao menos no que diz respeito aos padrões mínimos de proteção que precisam ser viabilizados por meio da ação estatal.
A cláusula de progresso constitui, nesse sentido, um instrumento de elevada importância no controle do processo de programação e de transformação da realidade social, por meio das escolhas orçamentárias.
A correção das distorções e sua justificativa podem surgir na condição de imperativos, por meio de juízos sobre a suficiência ou deficiência da proteção, os quais têm origem visível na programação orçamentária.

2. Orçamento público e leis orçamentárias

Conforme já se ressaltou na aula anterior, o conceito de orçamento não pode ser limitado à proposição de sua condição como mera peça técnica-financeira, que veicula a previsão de receitas e todas as autorizações para as despesas. Nesse sentido, já foi dito que o orçamento constitui instrumento de planejamento a partir do qual o Estado organiza e ordena como proporá atingir o conjunto de tarefas e finalidades públicas que lhes foram atribuídas pela Constituição ou pela ordem jurídica, a partir dos recursos financeiros que se encontram disponíveis.
Neste momento, cumpre assinalar que, na verdade, não temos apenas UM orçamento, mas ORÇAMENTOS, e não um único instrumento de planejamento à disposição do Estado, senão uma ESTRUTURA de planejamento. Tal estrutura é definida basicamente pelo texto do artigo 165, da CRFB de 1988, que propõe uma estrutura na qual interagem, em uma relação de interdependência vertical, três instrumentos: o Plano Plurianual (PPA), a lei de diretrizes orçamentárias (LDO) e a lei orçamentária anual (LOA).
Este é o texto do artigo 165, incisos I a III, no qual estão propostos tais instrumentos:
“Art. 165. Leis de iniciativa do Poder Executivo estabelecerão:
I - o plano plurianual;
II - as diretrizes orçamentárias;
III - os orçamentos anuais.”
E mesmo a própria lei orçamentária anual, que veicula o que se convenciona tratar por orçamento público, não propõe UM, mas TRÊS espécies de orçamentos, as quais devem ser tratadas como partes distintas, mas não como estruturas autônomas e independentes.
Nesse sentido, o artigo 165, § 5º da CRFB prevê que integrarão obrigatoriamente o orçamento anual: a) o orçamento fiscal; b) o orçamento de investimentos; c) o orçamento da seguridade social.
Confira-se, por oportuno, o texto do dispositivo:
“Art. 165 [...]
[...]
§ 5º - A lei orçamentária anual compreenderá:
I - o orçamento fiscal referente aos Poderes da União, seus fundos, órgãos e entidades da administração direta e indireta, inclusive fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público;
II - o orçamento de investimento das empresas em que a União, direta ou indiretamente, detenha a maioria do capital social com direito a voto;
III - o orçamento da seguridade social, abrangendo todas as entidades e órgãos a ela vinculados, da administração direta ou indireta, bem como os fundos e fundações instituídos e mantidos pelo Poder Público.”

IMPORTANTE: De acordo com o que prevê o § 5º, do artigo 165, quando se trata de orçamento de investimentos, está se apontando que, na lei orçamentária anual, deve constar a previsão de receitas e das despesas de capital, na categoria investimentos, das empresas que tenham participação pública em seu capital social. A norma constitucional não exige que conste da lei orçamentária anual, portanto, as despesas correntes dessas empresas estatais, senão as despesas de capital vinculadas a investimentos.

3. O conteúdo e a função das leis orçamentárias

Neste ponto, algumas questões são relevantes e precisam ser enfatizadas, sendo as seguintes:
a) Qual é a função de cada uma das leis orçamentárias na estrutura de planejamento público?
b) Como uma proposta orçamentária deve ser elaborada?
c) O que deve conter uma lei orçamentária e qual o objetivo a ser atendido por cada uma das leis descritas no artigo 165 da CRFB?
Sob o contexto das indagações referidas, e tomando-se como ponto de partida a noção de que tratamos aqui, de uma estrutura coordenada de planejamento, e que envolve a interação entre leis orçamentárias, é possível que agora passemos à descrição particularizada de como cada uma dessas leis (o PPA, a LDO, e a LOA) se comporta na estrutura descrita.

3.1. O plano plurianual (PPA)

Deve ter como conteúdo a fixação de diretrizes, objetivos e metas da Administração Pública para as despesas DE CAPITAL (excluídas, portanto, as despesas correntes), e para as despesas de caráter continuado. Despesas de capital são aquelas que constam do artigo 12, da Lei n. 4.320/64 e compreendem os investimentos, as inversões financeiras e as transferências de capital. Os programas de duração continuada envolvem despesas de caráter continuado, que são exatamente aquelas que não têm termo final em um exercício financeiro. Exercício financeiro, nos termos do artigo 34, da Lei n. 4.320/64, compreende período que coincide com o ano civil, portanto, 01 de janeiro a 31 de dezembro.
É o que prevê o artigo 165, § 1º, da CRFB, que segue transcrito:

“Art. 165 (...)
[...]
§ 1º - A lei que instituir o plano plurianual estabelecerá, de forma regionalizada, as diretrizes, objetivos e metas da administração pública federal para as despesas de capital e outras delas decorrentes e para as relativas aos programas de duração continuada.”

Detalhe importante está na forma de organização dos objetivos e das metas, que deve ser regionalizada, procurando assegurar que os efeitos socioeconômicos, resultantes da estrutura de planejamento estatal, contribuam para a redução das desigualdades regionais, que constitui, de outro modo, um dos objetivos da própria República Brasileira (artigo 3º, inciso III, da CRFB). Notem que, a estrutura proposta pela ordem constitucional brasileira expõe com evidência a função central que os orçamentos e as leis orçamentárias desempenham na modificação e na ordenação dos valores sociais e econômicos, afastando em definitivo qualquer pretensão de definição do orçamento sob uma perspectiva neutra.
Outro detalhe importante que precisa ser enfatizado está em uma vedação orçamentária que se encontra relacionada a um dos elementos que integram o PPA, os programas de duração continuada. Trata-se aqui, da vedação fixada pelo artigo 167, § 1º, da CRFB, que não permite o início de qualquer investimento, quando sua execução ultrapassar um exercício financeiro, que não se encontre previamente incluído no PPA, ou que tenha esta inclusão, previamente autorizada por meio de lei.
Portanto, nenhum programa de duração continuada pode ter seu início sem que estas despesas tenham sido previamente programadas no PPA, ou que sua inclusão tenha sido previamente autorizada por meio de lei. Não se concebe, desta forma, o início de qualquer espécie de investimento (obras públicas, v.g), cuja execução exceda um exercício financeiro, que já não se encontre incluído no PPA, ou que não tenha sua autorização prevista em lei.
Sem que sua inclusão esteja programada no PPA, ou autorizada em lei, não seria possível, v.g, conceber a execução de obras do interesse da Copa do Mundo de 2014.
Confira-se o texto do dispositivo:

“Art. 167. São vedados:
[...]
§ 1º - Nenhum investimento cuja execução ultrapasse um exercício financeiro poderá ser iniciado sem prévia inclusão no plano plurianual, ou sem lei que autorize a inclusão, sob pena de crime de responsabilidade.”

Notem que, segundo consta da parte final do texto transcrito, é possível que o PPA seja modificado no decorrer de sua execução, ou alterado durante o período de sua vigência. Causas excepcionais, como queda de arrecadação, riscos fiscais, conjuntura macroeconômica, podem orientar a revisão de investimentos e justificar a revisão de determinadas metas fixadas no PPA, adaptando-o à realidade em curso.

IMPORTANTE: Essa mesma orientação é fixada pela Constituição para todas as estruturas de planejamento orçamentário. Desse modo, se o PPA deve prever diretrizes e metas regionalizadas, o mesmo deve ocorrer com a lei orçamentária anual (LOA), conforme previsto pelo § 7º do artigo 165, quando exige que os orçamentos fiscal e de investimentos [que compõem a LOA], também terão como função a redução das desigualdades regionais, segundo critérios populacionais.

É o que se pode conferir do texto agora transcrito:

“Art. 165 [...]
[...]
§ 7º - Os orçamentos previstos no § 5º, I e II, deste artigo, compatibilizados com o plano plurianual, terão entre suas funções a de reduzir desigualdades inter-regionais, segundo critério populacional.”

3.2. A lei de diretrizes orçamentárias (LDO)

Conforme orienta o § 2º, do artigo 165, da CRFB, cabe à LDO, basicamente, definir regras para a elaboração da lei orçamentária anual (LOA) e fixar como as agências públicas responsáveis pela atividade de fomento aplicarão os recursos destinados para esta finalidade.
Seu CONTEÚDO restringe-se à fixação das metas e prioridades da Administração, bem como às despesas de capital previstas para o exercício financeiro posterior (esta é sempre uma regra para o planejamento orçamentário, no qual se tem uma organização direcionada para uma ação futura, ação que tem seu termo inicial no exercício financeiro seguinte).
Confira-se o texto do dispositivo referido, que segue transcrito:

“Art. 165 [...]
[...]
§ 2º - A lei de diretrizes orçamentárias compreenderá as metas e prioridades da administração pública federal, incluindo as despesas de capital para o exercício financeiro subsequente, orientará a elaboração da lei orçamentária anual, disporá sobre as alterações na legislação tributária e estabelecerá a política de aplicação das agências financeiras oficiais de fomento.”
Portanto a LDO é, assim como a LOA, uma lei anual, mas se trata de lei que orienta a elaboração desta última, e seu conteúdo também foi reforçado pelo texto da LC n. 101/2000, que prevê os seguintes elementos ADICIONAIS, em seu artigo 4º, inciso I, a à f, entre os quais se destacam, principalmente:
a) o equilíbrio entre as receitas e as despesas (as regras a partir das quais este equilíbrio terá de ser atingido por cada LOA decorrem das LDOs);
b) regras que orientem como os resultados de cada PROGRAMA que tenha dotação orçamentária serão avaliados;
c) limites para os empenhos (analisaremos este conceito no processo de execução orçamentária, sendo, basicamente, o ato que reserva determinado recurso financeiro, vinculando-o ao pagamento de determinada despesa, decorrente de obrigação que será assumida pelo poder público). É relevante ressaltar que quando se trata de LIMITES para os empenhos a norma jurídica não aponta como resultado o não pagamento de obrigações. Não se tem aqui autorização para o descumprimento de obrigações contratuais ou legais por iniciativa do Poder Público, decorrentes da fixação de limites para as despesas. O que se aponta pela norma jurídica é a proibição de que DESPESAS (e não seu pagamento, que pressupõe primeiro, a realização de um negócio jurídico, o empenho e por fim, a liquidação e o pagamento) sejam efetuadas ALÉM do limite dos CRÉDITOS orçamentários disponíveis. Portanto não se trata de autorizar TODAS as despesas que se pretenda realizar, e apenas se autorizar o pagamento daquilo que é possível se pagar. Na verdade a própria decisão inicial de se contrair ou gerar uma despesa está limitada por esta regra. Não se pode contrair despesas além dos recursos disponíveis. Isto reflete a noção de EQUILÍBRIO FINANCEIRO, de RESPONSABILIDADE FISCAL, e de EQUILÍBRIO ENTRE RECEITAS E DESPESAS, sendo a LIMITAÇÃO DO EMPENHO, um dos instrumentos que permitem ASSEGURAR esse EQUILÍBRIO.
Confira-se o destaque da LC n. 101/2000:

“Art. 4° A lei de diretrizes orçamentárias atenderá o disposto no § 2° do art. 165 da Constituição e:
I - disporá também sobre:
a) equilíbrio entre receitas e despesas;
b) critérios e forma de limitação de empenho, a ser efetivada nas hipóteses previstas na alínea b do inciso II deste artigo, no art. 9o e no inciso II do § 1o do art. 31;
c) (VETADO)
d) (VETADO)
e) normas relativas ao controle de custos e à avaliação dos resultados dos programas financiados com recursos dos orçamentos;
f) demais condições e exigências para transferências de recursos a entidades públicas e privadas;”

Muito embora a limitação dos empenhos esteja situada como um dos CONTEÚDOS da LDO, e isto seja consequência da LC n. 101/2000, este elemento também estabelece relação com outra VEDAÇÃO ORÇAMENTÁRIA [analisada posteriormente], fixada pelo artigo 167, inciso II, que prevê a proibição de que sejam realizadas despesas além dos limites dos créditos orçamentários autorizados. Não há despesa sem autorização para sua realização. Estas são expressas por créditos, que prevêem recursos para sua realização. Esta previsão que associa a identificação de um determinado montante de recursos financeiros a uma despesa, constante de uma LOA, exprime a autorização legislativa requerida.

PORTANTO, não é possível conceber despesa que não tenha sido prevista na LOA, pois cada programa ou projeto têm de ter sido contemplado nessa lei e, uma vez previsto, só pode ser executado no limite dos recursos que lhe foi atribuído. Só se pode gastar com previsão legislativa e nos limites dessa autorização.

Este é o texto do dispositivo referido:

“Art. 167. São vedados:I - o início de programas ou projetos não incluídos na lei orçamentária anual;
II - a realização de despesas ou a assunção de obrigações diretas que excedam os créditos orçamentários ou adicionais;

Outros elementos ainda devem integrar a LDO e serão analisados em aula específica sobre a ELABORAÇÃO da proposta orçamentária.

3.3. A lei orçamentária anual (LOA).

Deve prever o conjunto das receitas e despesas para o próximo exercício financeiro, representando, em última análise, o resultado de escolhas sobre como os recursos disponíveis serão destinados, para o fim de concretizar um determinado projeto político, social, econômico e cultural, de vigência determinada. Nessa perspectiva, a LOA tem por objetivo propor que, com o resultado das escolhas sobre a aplicação dos recursos disponíveis e previstos para um exercício financeiro, seja possível contribuir para a reduzir as desigualdades regionais, e concretizar um determinado modelo ou um projeto de realidade social, econômica e cultural. As escolhas são realizadas anualmente, e refletem uma decisão que precisa se encadear com decisões a serem tomadas em outros três exercícios, totalizando, assim, um mandato do gestor e do chefe do Poder Executivo. No intervalo de quatro anos, aquele terá a função de mediar e de gerir os conflitos socioeconômicos e terá a capacidade de interferir de forma positiva (ou negativa), de acordo com a qualidade das decisões que se encontrem definidas na LOA.
Trata-se aqui, da programação stricto sensu, de interesse imediato e concreto para a ordenação da vida social, econômica e cultural, em períodos anuais, e que se encontra previamente condicionada pelo cumprimento das metas e das diretrizes já fixadas na LDO e no PPA.
Por outro lado, a LOA também reflete uma programação de interesse mediato, em um processo permanente de concretização de direitos fundamentais, e que não se esgota no tempo. Isso porque, o projeto político definido na Constituição expõe pretensões de durabilidade e o compromisso com a dignidade de vida é permanente. Nessa realidade, a posição do gestor é a de, tão somente, mediar, por meio de escolhas realizadas anualmente, e limitadas a um período de quatro anos, o modo como os direitos fundamentais deverão ser concretizados, progressivamente, e o modo como o projeto da Constituição terá condições de se perpetuar.
Sendo assim, muito embora as escolhas orçamentárias sejam limitadas a períodos anuais, e se encadeiem em um interstício de quatro anos (limitados pelo mandato representativo do chefe do Poder Executivo), essas escolhas produzem efeitos de longo prazo, se forem compreendidas como partes de um processo duradouro, e permanente, de proteção progressiva de direitos fundamentais essenciais ao desenvolvimento digno da vida em uma comunidade, no interesse das presentes, mas também das futuras gerações.

A LDO veicula, portanto, a concretização e a especificação das metas e objetivos das demais leis orçamentárias, e representa o momento final do processo de programação, da estrutura de planejamento e de coordenação referida nesta aula.
Tem-se, aqui, a evidência da relação de coordenação que deve ser estabelecida entre todas as leis orçamentárias na estrutura de planejamento que se encontra fixada pela CRFB (artigo 165, § 7º).

Por fim, deve-se salientar que a LOA também expõe três modalidades de orçamento, que a ela devem estar integrados, conforme já foi registrado: o orçamento fiscal, de investimentos e da seguridade social. Estes decorrem da regra expressa pelo artigo 165, § 5º, I a III, da CRFB e veicula os princípios da universalidade e da unidade do orçamento, pelos quais todas as receitas e despesas de todos os órgãos ou entidades públicas devem ser objeto de previsão no orçamento, e todas as espécies de orçamento devem ser reproduzidas em peça única, sob metodologia única de elaboração [universalidade e unidade, respectivamente].

PORTANTO, temos definida pela ordem constitucional brasileira, uma estrutura de planejamento para a atividade orçamentária, que propõe ao orçamento uma função de instrumento de intervenção e planificação sobre as relações econômicas e sociais, a partir da organização e da composição da relação entre receitas e despesas, definindo [decisões públicas] como os recursos disponíveis serão aplicados para o atendimento de diretrizes, metas e objetivos, sempre orientados de modo a contribuir para a redução das desigualdades regionais. Nesta perspectiva, permite-se evidenciar que, em substituição a um orçamento, a ordem constitucional brasileira propõe uma estrutura de planejamento que é o resultado da COORDENAÇÃO de LEIS ORÇAMENTÁRIAS, estruturas como estruturas de PLANIFICAÇÃO. O PPA, a LDO e as LOAs são, em essência, planos, decisões públicas que ordenam e orientam como determinados resultados serão ou poderão ser atingidos.

AULA 10



Aula 10
Tema: Orçamento público. Conceitos, princípios orçamentários e vedações orçamentárias.
O enfoque escolhido para o fim de organizar a apresentação deste curso foi o de considerar a atividade financeira do Estado como processo, cuja função preponderante é a de viabilizar que cada um de nós pudesse ter acesso e ser capaz de desenvolver plenamente suas capacidades, potencialidades e os elementos identificadores de sua personalidade, atingindo níveis de bem-estar que fossem definidos por uma determinada experiência jurídica, como satisfatórios, suficientes e mínimos. É assim que se pôde compreender e considerar a função das receitas, como as fontes de financiamento capazes de assegurar que tais objetivos pudessem ser atendidos e atingidos, e as despesas, estas representativas justamente das finalidades existenciais que precisam ser atingidas: prioridades representativas dos níveis de proteção que foram previamente definidos como tarefas de uma experiência transitória, para um interstício de até quatro anos, sob o condicionamento de regras e princípios de uma experiência jurídica, de um projeto político e existencial proposto por uma Constituição, aberta a uma ordem pública convencional e a outras experiências externas.
Chega o momento de compreender o processo de formação destas escolhas, de organização das metas, e de integração destas com as capacidades financeiras, restrições e a disponibilidade econômica do Estado. Aspectos estes que serão analisados no âmbito de planos concretizadores de direitos fundamentais, denominados orçamentos.
Como exercício para a reflexão sobre a relação entre o orçamento e a proteção de direitos fundamentais, iniciemos analisando a correção (ou não) de duas afirmações:
a) Um juiz de Direito propõe que a nova lei das prisões cautelares merece críticas, porque não previu dotação orçamentária para assegurar a fiscalização dos detentos;
b) O diretor da SECOPA salienta que a execução das obras não será prejudicada pela mudança no comando do DNIT, porque os recursos já estariam assegurados em dotações reservadas no orçamento da autarquia;
c) Analisemos também o seguinte cenário: uma peça publicitária da União expõe números que indicam que nos últimos oito anos, há uma evolução progressiva de investimentos na merenda escolar, mas não os vincula à melhoria nos números da avaliação do ensino pelo MEC.
Todos os exemplos ilustram e reforçam algumas realidades que foram desenvolvidas ao longo do conjunto de aulas anteriores, e que convergem para a demonstração de uma relação intrínseca entre escolhas sobre a destinação dos recursos financeiros, e a qualidade (ou o nível de proteção) da ação estatal em benefício da coletividade.
As primeiras aulas procuraram expor a atividade financeira sob uma primeira abordagem de relação estática. Nessa perspectiva, as definições de receita e de despesa foram examinadas com autonomia, para o fim de enfatizar que o exercício das liberdades e a concretização de todos os direitos fundamentais refletem a realização de despesa, e que esta despesa requer a identificação de suas fontes de financiamento. O financiamento e a realização das despesas envolvem o exercício de atividade financeira por meio do Estado, e expõem um problema de justiça, problema este que possui várias derivações:  
a) Se todos os membros da coletividade devem ser protegidos (igual proteção), este imperativo propõe, necessariamente, os mesmos níveis de contribuição (igualdade na contribuição)?
b) A igual proteção requer, de fato, ou propõe, efetivamente, a correspondência com níveis de proteção isonômicos? Aqui, a questão nos remete a um problema de justiça distributiva (distribuição das prestações).
A obra de Murphy e Nagel indica que igual proteção requer a intervenção estatal para o fim de corrigir distorções, visando que o valor a ser protegido em benefício de todos (este parece ser o vetor de identidade para a noção de igual proteção) – a dignidade – possa ser usufruído em condições de isonomia pela comunidade. Igual proteção não requer a simetria subjetiva nos níveis de prestações, ou ainda, a igual distribuição dos benefícios.
Esse cenário permitiu demonstrar, na primeira parte das aulas (perspectiva estática), que os direitos fundamentais implicam custos, e que sua proteção requer o envolvimento e o exercício de atividade financeira estatal. O exercício de liberdades requer um sistema de justiça, e um sistema de segurança pública, sendo que estes representam despesa para as funções públicas. A proteção social requer um sistema previdenciário, de assistência, e de saúde. Bem-estar envolve a interação entre esse conjunto de prestações, decorrentes de ações públicas, e de atividade financeira do Estado.
Diante de semelhante contexto, chega o momento de se expor aquelas definições em uma relação dinâmica, na qual serão examinados em um processo de decisão, que envolve planejamento, e que produz resultados de longo prazo, podendo expor um compromisso mais ou menos intenso com o desenvolvimento dos objetivos de um Estado social, democrático e ambiental de Direito, e com o desenvolvimento digno da vida.
São estes, em síntese, os problemas que serão examinados ao longo desta aula, compreendendo as definições, os elementos, e as funções do orçamento público.
1. O orçamento e suas definições.
IMPORTANTE: O fundamento da noção de orçamento é o controle entre receitas e despesas. Sua definição tem relação direta com a revisão do conjunto de funções do Estado, através de sua atribuição pelos textos das Constituições contemporâneas. De um Estado liberal para um Estado social e democrático (que tem vinculado um conjunto de tarefas), a construção do orçamento implica admitir que o processo que reúne a previsão da arrecadação e da despesa expõe, na verdade, um processo de escolhas de prioridades entre diversas que são possíveis, e que representam, em última análise, os efeitos de decisões políticas com efeitos diferenciados sobre o desenvolvimento da realidade econômica e social. Decisões no âmbito de um orçamento reproduzem, necessariamente, modificações sobre a realidade fática, que não deixa de ser influenciada pelo que se PROPÕE (pode ou não ser concretizado da forma como foi proposto) em um orçamento anual.
a) Orçamento como instrumento financeiro e contábil: Peça técnica que contempla a previsão de arrecadação (receita) e a autorização dos gastos (despesas), que não lhe atribui qualquer função externa na coordenação da organização social e econômica da atividade pelo Estado. Nesta elaboração, que prevê o conceito clássico do orçamento, não se enfatiza o elemento funcional da atividade de planificação, na qual está acentuada o conceito contemporâneo de orçamento programa. Tem-se neste primeiro conceito, dá-se ênfase à ideia de um ATO que contém a aprovação prévia de receitas e de despesas que serão efetuadas pelo Estado (receitas e despesas públicas). A definição clássica de orçamento privilegia um enfoque sobre o CONTEÚDO. Seria, portanto, uma peça técnica de previsão de receitas e de autorização para as despesas públicas, sem qualquer avaliação ou julgamento sobre a identidade ou idoneidade dessas despesas em relação às necessidades concretas do próprio Estado, ou ainda, das necessidades ou prioridades da sociedade, ou sobre os objetivos sociais ou econômicos, que teriam de ser atingidos com a execução dessa peça (orçamento).
b) Orçamento como instrumento de planejamento e ordenação da vida social (orçamento-programa): O conceito foi proposto pelo professor José Afonso da Silva (2000) e privilegia o elemento funcional do orçamento, compreendido como instrumento de programação e de planejamento da atividade estatal, sendo o orçamento, instrumento para a realização dos objetivos, metas e prioridades que tenham sido definidas em um determinado momento pela Administração. Fica evidente na noção de orçamento-programa, a capacidade que lhe é atribuída de modificar a realidade econômica e social, propondo-lhe novas funções adaptadas a cada forma de organização estatal, interferindo em maior ou menor grau sobre essas realidades, de acordo com as escolhas ou opções realizadas pelo chefe do Poder Executivo.
Note-se, entretanto, que planificação não necessariamente representa dirigismo estatal da economia, senão reforça a ideia de planejamento e de ordenação das metas e dos objetivos estatais, situados estes no contexto de uma economia de mercado, que agora agrega a necessidade de realização de outros valores, sociais, culturais, assistenciais, ecológicos, etc...
Conceito proposto pelo professor José Afonso da Silva (2000):
“(...) processo e o conjunto integrado de documentos pelos quais se elaboram, se expressam, se aprovam, se executam e se avaliam os planos e programas de obras, serviços e encargos governamentais, com estimativa da receita e fixação das despesas de cada exercício financeiro.”[1]
IMPORTANTE: Os aspectos (ou elementos) que identificam o orçamento:
a) Político: Uma decisão sobre uma determinada organização orçamentária pode refletir objetivos mais ou menos sociais, de maior ou menor interferência na economia, mais ou menos gastos com o custeio dos serviços públicos ou despesas com pessoal, etc...
b) Econômico: Uma decisão que reflete o estado (que é apenas transitório) da economia;
c) Técnico: Reúne a elaboração financeira das receitas e das despesas;
d) Jurídico: Porque representa uma decisão que não é arbitrária, nem unilateral, senão o efeito coordenado de opções, segundo a orientação da ordem constitucional e da ordem jurídica nacional (CRFB, Lei n. 4.320/64 e LC n. 101/2000).
2. A natureza jurídica da lei orçamentária.
Lei em sentido formal e material: posição do professor Régis Fernandes de Oliveira (2006). Nesta leitura, o orçamento seria lei em sentido formal, porque resulta de aprovação de um processo legislativo. Material, porque agrega: a) a capacidade de inovar de forma primária a ordem jurídica, gerando direitos e obrigações de forma originária; b) coeficiente de generalidade e de abstração, não se aplicando de forma direta a situações específicas e determinadas, senão através de subsunção da hipótese normativa aos fatos;
Orientação do STF: A lei orçamentária tradicionalmente não era considerada como lei em sentido material pelo fato de não expor suficiente coeficiente de generalidade capaz de atrair a fiscalização em processo objetivo de fiscalização da constitucionalidade das leis. Uma vez que a lei propunha regras com termo inicial e final em um ano e, alcançando apenas situações determinadas naquele programa específico, não se teria, ao juízo do STF, generalidade e abstração, atributos essenciais das leis em sentido material.
Mais recentemente, a orientação do mesmo STF (ADIMC n. 4048/DF) propõe também que as normas orçamentárias expõem-se à fiscalização objetiva, não sendo aquela circunstância suficiente para lhes retirar a generalidade própria dos atos legislativos. Seriam assim, atos dotados de generalidadeabstração e capacidade de inovar de forma primária a ordem jurídica. Nesta abordagem, o fato de o orçamento deter a capacidade de interferir de forma primária sobre a realidade social, econômica e financeira de um ano não lhe retira a generalidade e a abstração próprios de um ato legislativo, especialmente porque se trata de uma previsão de receita e uma previsão de despesas. Tem-se, aqui, um prognóstico; a proposição de um programa. Por esta razão, tem-se lei em sentido formal e material. Esta é a ementa do julgamento, que segue transcrita:
“EMENTA: MEDIDA CAUTELAR EM AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. MEDIDA PROVISÓRIA N° 405, DE 18.12.2007. ABERTURA DE CRÉDITO EXTRAORDINÁRIO. LIMITES CONSTITUCIONAIS À ATIVIDADE LEGISLATIVA EXCEPCIONAL DO PODER EXECUTIVO NA EDIÇÃO DE MEDIDAS PROVISÓRIAS. I. MEDIDA PROVISÓRIA E SUA CONVERSÃO EM LEI. Conversão da medida provisória na Lei n° 11.658/2008, sem alteração substancial. Aditamento ao pedido inicial. Inexistência de obstáculo processual ao prosseguimento do julgamento. A lei de conversão não convalida os vícios existentes na medida provisória. Precedentes. II. CONTROLE ABSTRATO DE CONSTITUCIONALIDADE DE NORMAS ORÇAMENTÁRIAS. REVISÃO DE JURISPRUDÊNCIA. O Supremo Tribunal Federal deve exercer sua função precípua de fiscalização da constitucionalidade das leis e dos atos normativos quando houver um tema ou uma controvérsia constitucional suscitada em abstrato, independente do caráter geral ou específico, concreto ou abstrato de seu objeto. Possibilidade de submissão das normas orçamentárias ao controle abstrato de constitucionalidade. III. LIMITES CONSTITUCIONAIS À ATIVIDADE LEGISLATIVA EXCEPCIONAL DO PODER EXECUTIVO NA EDIÇÃO DE MEDIDAS PROVISÓRIAS PARA ABERTURA DE CRÉDITO EXTRAORDINÁRIO. Interpretação do art. 167, § 3º c/c o art. 62, § 1º, inciso I, alínea "d", da Constituição. Além dos requisitos de relevância e urgência (art. 62), a Constituição exige que a abertura do crédito extraordinário seja feita apenas para atender a despesas imprevisíveis e urgentes. Ao contrário do que ocorre em relação aos requisitos de relevância e urgência (art. 62), que se submetem a uma ampla margem de discricionariedade por parte do Presidente da República, os requisitos de imprevisibilidade e urgência (art. 167, § 3º) recebem densificação normativa da Constituição. Os conteúdos semânticos das expressões "guerra", "comoção interna" e "calamidade pública" constituem vetores para a interpretação/aplicação do art. 167, § 3º c/c o art. 62, § 1º, inciso I, alínea "d", da Constituição. "Guerra", "comoção interna" e "calamidade pública" são conceitos que representam realidades ou situações fáticas de extrema gravidade e de conseqüências imprevisíveis para a ordem pública e a paz social, e que dessa forma requerem, com a devida urgência, a adoção de medidas singulares e extraordinárias. A leitura atenta e a análise interpretativa do texto e da exposição de motivos da MP n° 405/2007 demonstram que os créditos abertos são destinados a prover despesas correntes, que não estão qualificadas pela imprevisibilidade ou pela urgência. A edição da MP n° 405/2007 configurou um patente desvirtuamento dos parâmetros constitucionais que permitem a edição de medidas provisórias para a abertura de créditos extraordinários. IV. MEDIDA CAUTELAR DEFERIDA. Suspensão da vigência da Lei n° 11.658/2008, desde a sua publicação, ocorrida em 22 de abril de 2008.” (STF. Tribunal Pleno. ADIMC n. 4048/DF. Rel. Min. Gilmar Mendes. DJe de: 22.08.2008).
3. O orçamento e a vinculação do administrador.
QUESTÃO: Se o orçamento apenas realiza um juízo prospectivo (apenas prevê a arrecadação e os gastos, ou ainda, prevê uma determinada realidade de tarefas e de realizações por iniciativa do Estado), o orçamento pode ser considerado uma peça de ficção?
Em outras palavras, o administrador, prefeito, governador, presidente da república, pode escolher entre realizar ou não as despesas apontadas em sua proposta, que foi aprovada pelo Poder legislativo? Pode escolher entre cumprir ou não aquelas tarefas em termos de gastos públicos?
De fato, nem sempre é possível realizar todas as tarefas definidas como prioridades e, portanto, como despesas no plano de um orçamento anual. É, também, por essa razão que se admite que despesas sejam anuladas: para atender prioridades que foram consideradas mais relevantes diante da necessidade de atender despesas imprevistas, extraordinárias, ou ainda, reforçar a dotação de outra despesa que, em um determinado momento, exige mais recursos de um conjunto finito, e que, em um julgamento de prioridades, prevalece sobre a despesa anulada ou que será anulada.
Entretanto, determinadas despesas nunca poderão ser anuladas ou nunca poderão deixar de ser realizadas, como aquelas destinadas ao custeio da folha de pessoal, os encargos da dívida, e as ações de saúde e de ensino. O desatendimento destas despesas implica em crime de responsabilidade do chefe do Poder Executivo, conforme se afere, em relação à União, do texto do artigo 85, inciso VI, da CRFB, in verbis:
“Art. 85. São crimes de responsabilidade os atos do Presidente da República que atentem contra a Constituição Federal e, especialmente, contra:
[...]
VI - a lei orçamentária;”
Já sob essa perspectiva, fica visível que quando se fala em discricionariedade – ou liberdade para que o administrador realize as escolhas sobre prioridades que deverão ser atendidas pelo Estado, a partir dos recursos públicos que estão à sua disposição –, esta não é plena e tampouco absoluta.
Primeiro, há decisões que escapam de sua capacidade de realizar opções. É o caso  daquelas despesas já apontadas. Sobre estas não cabe escolher entre realizá-las ou não. O que lhe cabe é definir como atingir os objetivos garantia da saúde e do ensino, mas não lhe cabe gastar menos do que lhe foi exigido pela Constituição.
No caso do planejamento orçamentário municipal, a restrição sobre essa capacidade de realizar escolhas é ainda mais evidente, quando se verifica, do texto do artigo 44,caput, da Lei n. 10.257/2001 (Estatuto das Cidades), que o próprio processo de elaboração da lei orçamentária anual [nos municípios] depende de sua exposição pública em debates, consultas e audiências públicas. A realização destas constitui pressuposto indispensável para a aprovação pela Câmara Municipal, sob pena de justificar sua invalidação.
Mesmo em relação a despesas que não contam com a especificação/quantificação pela lei ou pela CRFB, NÃO se pode admitir como correta a afirmação de que o prefeito, o governador ou o presidente da república detenham ampla capacidade para decidir de que forma serão gastos os recursos públicos disponíveis.
É necessário esclarecer e distinguir duas situações que envolvem a determinação do que sejam as prioridades públicas. Pela primeira hipótese, pode-se ter como objeto, escolhas sobre a medida em que serão realizados os gastos, de modo a contemplar todas as necessidades públicas. Diante da segunda hipótese, temos como objeto, escolhas sobre que gastos e, portanto, que modalidade de necessidades serão ou não serão contempladas como prioridades em um determinado momento.
Na primeira hipótese, teremos que algumas necessidades prevalecerão e terão preferência na alocação e reserva dos recursos públicos, mas a definição desta escala [móvel] não subtrai do administrador o dever de realizar todas as tarefas que possui por atribuição legal ou constitucional.
Sendo assim, não pode deixar de assegurar saneamento básico; de manter a qualidade dos recursos naturais; ou de assegurar acessibilidade aos portadores de necessidades especiais. Deve gastar e prever tais gastos em cada proposta orçamentária, e deve submeter ao Poder legislativo esta previsão todos os anos, não lhe sendo possível subtrair tal previsão. O que lhe cabe é definir, segundo a escassez e a finitude de tais recursos, quais destas necessidades, serão atendidas em maior ou menor grau.
Sob esta perspectiva, não cabe a justificativa de que o prefeito, o governador e o presidente da república possuem a capacidade para definir de forma plena suas escolhas sobre o que deve ou não ser atendido pelos recursos que estão à sua disposição.
Se o orçamento é uma decisão política, não representa uma decisão exclusivamente política. É política, porque propõe um plano, um programa, uma proposta que expõe de forma planejada, suas metas, ações e projetos para um ano das atividades públicas, mas não representa e não pode representar uma decisão exclusiva do chefe do Executivo. Sua capacidade de escolha é limitada e não pode se desvincular dos objetivos e tarefas que devem ser atendidos, por expressa definição legal e constitucional.
A última palavra continua a ser atribuída ao chefe do Poder Executivo, mas esta decisão NÃO É UNILATERAL e muito menos arbitrária, não lhe sendo permitido impor leituras ou posturas autoritárias sobre como pretende interferir na realidade, na forma de gastos públicos, deixando de atender a imposições como as que já foram descritas.
PORTANTO:
a) O administrador não possui ampla liberdade para definir que tarefas terá de realizar, senão liberdade limitada para definir como terá de realizar tais tarefas públicas, que foram apontadas pela lei ou pela Constituição;
b) O administrador não poderá, de outro lado, como regra geral, deixar de realizar as despesas que se propôs realizar. Fosse admitido que pudesse fazê-lo, ter-se-ia descaracterizado o sentido de planejamento da atividade estatal, seja sob o ângulo do controle do equilíbrio financeiro de sua atividade, seja sob o ângulo político e social de interferência sobre a realidade, a partir de um determinado programa de metas de governo. Pode-se admitir, como exceção, a possibilidade de que alguns gastos não sejam realizados, não porque não mais se pretende realizá-los, mas porque decorrem da anulação da despesa para o atendimento de necessidades vinculadas a créditos adicionais, por exemplo (suplementares, especiais e extraordinários).
Como regra geral, tem-se que as despesas que importem o cumprimento de tarefas impositivas, seja decorrentes de lei ou da Constituição, não podem deixar de ser pagas e, portanto, constituem escolhas que não podem ser livremente manipuladas pelo chefe do Poder Executivo. Só lhe cabe adimplir e realizá-las, não podendo subtraí-las da proposta orçamentária anual, assim como também não pode removê-las, anulando-as após a aprovação pelo Poder Legislativo.
IMPORTANTE: As despesas que decorrem de imposições legais ou constitucionais representam, ao particular, fontes que fundamentam direitos fundamentais que podem ser oponíveis perante o Estado. Este não pode agir nem aquém e nem além do que lhe fixou a Constituição e as leis em relação ao atendimento de metas e tarefas (necessidades públicas). Não pode desconsiderar tais necessidades como prioridades (déficit), assim como também não pode agir além das autorizações que possui (excesso). Se alguma liberdade há, esta não incide sobre atender ou deixar de atender aquelas necessidades, senão sobre como devem ser atendidas no contexto em que os recursos financeiros não são ilimitados.
QUESTÃO: O controle do orçamento e os princípios constitucionais da Administração Pública (artigo 37, caput, da CRFB). Perante o que prevê o princípio da eficiência, é suficiente realizar as tarefas (gastar), ou lhe é exigido como condição indispensável, gastar da melhor forma que lhe seja possível? Exemplo: gastos com saúde e com ações e ensino. Se, em uma determinada lei orçamentária, está previsto que uma parcela dos recursos vinculados será destinada à construção de escolas, mas em todos os anos em que essas despesas foram realizadas, nenhuma evidência de melhoria dos níveis de ensino foi constatada, é correto admitir que na próxima lei orçamentária, o chefe do Poder Executivo está autorizado a permanecer com estas ações como instrumento para a aplicação dos recursos?
IMPORTANTE: O planejamento da ação pública, através do instrumento orçamento, enfatiza a importância da qualidade das escolhas realizadas pelo chefe do Poder Executivo, uma vez que destas escolhas resultará maior qualidade de vida, ou a degradação dos níveis de proteção já atingidos.
Um exemplo claro pode ser visualizado nas escolhas vinculadas a uma política pública de saúde. O gestor tem ao seu alcance a possibilidade de definir suas prioridades, sendo possível decidir que fará o uso dos recursos disponíveis para financiar ações preventivas (para que deixe de gastar com outras ações públicas, financiando ações que visem mitigar os efeitos nocivos à qualidade de vida), ou ainda poderá fazer o uso dos mesmos recursos para manter ações de combate aos efeitos da perda de enfermidades, tratamentos e outras ações que visem restaurar a qualidade de vida.
Fica clara, nesse contexto, a relevância do instrumento orçamento público para a definição dos níveis de proteção social, diante da relação existente entre as escolhas sobre as prioridades públicas e seus efeitos. A qualidade destas escolhas influencia decisivamente a extensão da proteção que se pretende proporcionar e os níveis de bem-estar que se pretendem atingir, através da ação pública.
Sendo assim, é neste momento que se podem visualizar, com ênfase, as condições de concretização dos direitos fundamentais e, principalmente, a capacidade e a identidade de um determinado modelo de Estado que viabilize esta proteção, e os níveis de qualidade de vida envolvidos. Em um Estado ambiental, a natureza da proteção social, e os níveis de proteção que se pretendem atingir estabelecem relação direta com a autorização e a capacidade de se realizar escolhas e tomar decisões sobre prioridades públicas, inserindo-se entre estas, a necessidade de conservação da qualidade dos recursos naturais, por se admitir que desta decorra a possibilidade de se proteger um direito a viver dignamente em um ambiente de qualidade. Esta noção foi proposta, inicialmente, por Siegmar Streckel, para quem, estaria compreendida na capacidade de definir prioridades políticas, a possibilidade de se adotar medidas razoáveis no âmbito de uma política ambiental racional.
Diante dos argumentos expostos, pode-se argumentar que, no plano das escolhas orçamentárias sobre a proteção de direitos fundamentais, especialmente aqueles diretamente vinculados às condições para o desenvolvimento de uma vida digna, não se admite que as funções estatais detenham a capacidade de realizar escolhas sobre o que se proteger ou o quando proteger. Viabilizar a existência e assegurar o igual acesso às condições indispensáveis para o desenvolvimento de níveis suficientes e satisfatórios de bem-estar coletivo constitui um dever estatal, razão pela qual não está ao alcance da ação pública a escolha sobre se este objeto deverá ser protegido e quando o será. A ação deve acontecer e será de forma   permanente, periódica, ininterrupta e progressiva. Em semelhante contexto, se é possível admitir margem de discrição à decisão do legislador, esta se concentra exclusivamente sobre o componente modal, adstringindo-se, portanto, ao como proteger, e ao como assegurar que aqueles objetivos sejam atingidos.
Nesse plano de argumentação, os caminhos e as alternativas encontram-se abertas à ação decisória, condicionadas em última análise, pela finalidade que se pretende assegurar.
É importante salientar que o como proteger envolve, fundamentalmente, um problema de determinação dos níveis de proteção, sendo esta a causa que enfatiza a importância das escolhas que se encontram reservadas à função legislativa, em concorrência com o chefe do Poder Executivo, na elaboração e aprovação da proposta orçamentária.
4. Os princípios orçamentários
a) Princípio da universalidade ou princípio do orçamento global (artigo 165, § 5º, inciso I a III, da CRFB): todas as receitas e todas as despesas devem estar previstas na proposta orçamentária e, posteriormente, na lei orçamentária. A lei orçamentária deve prever todos os tipos de orçamento (fiscal, de investimentos das empresas estatais e o da seguridade social), contemplando a arrecadação prevista e as despesas relacionadas a cada um deles. A exceção está vinculada aos tributos que tenham sido fixados após a aprovação da lei orçamentária, para o próximo exercício, que, por essa razão, não foram objeto de previsão.
Quando se faz referência à previsão de arrecadação de todas as receitas e autorização para todas as despesas, está se tratando de todos os Poderes, fundos públicos, órgãos e entidades da Administração direta e indireta. Todas estas devem estar contempladas na proposta de orçamento anual. Este princípio enfatiza o CONTEÚDO da lei orçamentária, e tem origem em emenda constitucional à Constituição de 1891, propondo prevenir o que Ruy Barbosa tratava com caudas orçamentárias.
IMPORTANTE: Já dissemos que o orçamento, muito embora não reproduza, exclusivamente, a perspectiva de instrumento técnico de planejamento, tem como um de seus principais conteúdos, a previsão da receita e a autorização das despesas. Como se pode compreender, nesse contexto, a hipótese do tributo que tenha sido instituído após a aprovação da LDO e da LOA. Pode ser arrecadado? Apesar de ser uma fonte de receita, e observando que todas as receitas devem estar contempladas no orçamento como consequência do princípio da universalidade, esta hipótese constitui exceção, de modo que, instituído o tributo, embora não tenha sido previsto pela lei orçamentária, nenhum óbice se opõe à sua exigibilidade, conforme o enunciado da súmula n. 66, do STF, ainda em vigor.
b) Princípio da anualidade ou periodicidade (artigo 165, III, CRFB): a previsão de receitas e de despesas tem termo inicial e final, vinculado a um exercício financeiro (um ano). Entretanto, nem sempre a execução das despesas está vinculada ao período de um exercício financeiro, sendo este o caso dos programas de duração continuada, que se relaciona ao plano de investimentos públicos inseridos no contexto do Plano Plurianual. Neste caso, deve-se enfatizar que muito embora a despesa não tenha termo final em um exercício financeiro, a previsão de receitas e despesas continua a ser realizada ano a ano, sendo esta, também, a forma de execução dessas despesas.
c) Princípio da exclusividade (artigo 165, § 8º, CRFB): não podem estar previstas, na lei orçamentária, quaisquer matérias estranhas à previsão das receitas e à autorização das despesas. Como exceções são admitidas as previsões para: a) créditos suplementares (não são especiais e nem extraordinários), b) contratação de operações de crédito, mesmo que por antecipação de receita. Este último caso prevê, v.g, financiamento realizado pelo Poder Público perante as instituições financeiras (não perante o próprio Poder Público, face a proibição inscrita no artigo 167, inciso X, da CRFB, que trata das vedações orçamentárias, objeto de aula posterior prevista no plano) para o custeio da folha de subsídios dos servidores, até que os recursos sejam liberados com a abertura do exercício financeiro.
d) Princípio da unidade (artigo 165, § 5º, CRFB): tradicionalmente, tem-se definido tal princípio propondo-se que a peça física do orçamento é única, muito embora contemple tipos de orçamentos distintos, sendo que, nessa mesma peça, devem estar contemplados todos os gastos e todas as despesas públicas para um exercício financeiro. Mais correto, seria admitir, como propõe o professor José Afonso da Silva (2000), que o princípio da unidade orçamentária veicula a ideia de unidade na programação e no planejamento, entre os vários tipos de orçamentos previstos pelo artigo 165, da CRFB. A unidade não seria, portanto, meramente formal, senão uma unidade material de planejamento e de organização.
e) Princípio da não afetação (artigo 167, inciso IV, da CRFB): não se permite que a receita de impostos seja vinculada ao custeio de ações de quaisquer órgãos, fundos ou despesas, admitindo-se como exceções a repartição das receitas oriundas dos artigos 158 e 159 da CRFB, o custeio das ações de saúde e de ensino, atividades de administração tributária, e a prestação de garantias às operações de crédito por antecipação de receita, tal como previsto no artigo 165, § 8º e no artigo 167, § 4º, da CRFB.
f) Princípio da programação (artigo 48, inciso I e IV, e 165, § 4º, CRFB): tem relação com a forma de elaboração do orçamento. Por este princípio, o orçamento deve propor a formulação de objetivos, e o estudo das alternativas de ação futura que sejam compatíveis e adequadas para alcançar as finalidades governamentais propostas, reduzindo-as na sequencia a um conjunto limitado de alternativas e, posteriormente, apontando como os objetivos serão alcançados pelas alternativas eleitas.
5. As vedações orçamentárias.
O conjunto de proibições e restrições encontra-se fixado ao longo do artigo 167, inciso I usque XI, e §§ 1º, 2º e 3º, da CRFB de 1988:
“Art. 167. São vedados:
I - o início de programas ou projetos não incluídos na lei orçamentária anual;
II - a realização de despesas ou a assunção de obrigações diretas que excedam os créditos orçamentários ou adicionais;
III - a realização de operações de créditos que excedam o montante das despesas de capital, ressalvadas as autorizadas mediante créditos suplementares ou especiais com finalidade precisa, aprovados pelo Poder Legislativo por maioria absoluta;
IV - a vinculação de receita de impostos a órgão, fundo ou despesa, ressalvadas a repartição do produto da arrecadação dos impostos a que se referem os arts. 158 e 159, a destinação de recursos para as ações e serviços públicos de saúde, para manutenção e desenvolvimento do ensino e para realização de atividades da administração tributária, como determinado, respectivamente, pelos arts. 198, § 2º, 212 e 37, XXII, e a prestação de garantias às operações de crédito por antecipação de receita, previstas no art. 165, § 8º, bem como o disposto no § 4º deste artigo;
V - a abertura de crédito suplementar ou especial sem prévia autorização legislativa e sem indicação dos recursos correspondentes;
VI - a transposição, o remanejamento ou a transferência de recursos de uma categoria de programação para outra ou de um órgão para outro, sem prévia autorização legislativa;
VII - a concessão ou utilização de créditos ilimitados;
VIII - a utilização, sem autorização legislativa específica, de recursos dos orçamentos fiscais e da seguridade social para suprir necessidade ou cobrir déficit de empresas, fundações e fundos, inclusive dos mencionados no art. 165, § 5º;
IX - a instituição de fundos de qualquer natureza, sem prévia autorização legislativa.
X - a transferência voluntária de recursos e a concessão de empréstimos, inclusive por antecipação de receita, pelos Governos Federais e Estaduais e suas instituições financeiras, para pagamento de despesas com pessoal ativo, inativo e pensionista, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.
XI - a utilização dos recursos provenientes das contribuições sociais de que trata o art. 195, I, a, e II, para a realização de despesas distintas do pagamento de benefícios do regime geral de previdência social de que trata o art. 201.
§ 1º - Nenhum investimento cuja execução ultrapasse um exercício financeiro poderá ser iniciado sem prévia inclusão no plano plurianual, ou sem lei que autorize a inclusão, sob pena de crime de responsabilidade.
§ 2º - Os créditos especiais e extraordinários terão vigência no exercício financeiro em que forem autorizados, salvo se o ato de autorização for promulgado nos últimos quatro meses daquele exercício, caso em que, reabertos nos limites de seus saldos, serão incorporados ao orçamento do exercício financeiro subsequente.
§ 3º - A abertura de crédito extraordinário somente será admitida para atender a despesas imprevisíveis e urgentes, como as decorrentes de guerra, comoção interna ou calamidade pública, observado o disposto no art. 62.
Basicamente, temos que:
a) Todo programa e projeto associados à despesa específica, só podem ter início se previstos na LOA. Não existe plano para o fim de justificar despesas se não contemplado na LOA. Pretensões de realização de despesas não existem, se não previstas na LOA.
b) Se todo gasto deve ter previsão na LOA, e deve estar associado a algum programa ou projeto, que por sua vez devem estar contemplados na LOA, esse gasto não pode exceder o limite dos recursos que estão disponíveis na forma de dotações orçamentárias alocadas para seu atendimento (créditos orçamentários). Despesas que excedam os créditos orçamentários ou aqueles adicionais (suplementares, especiais ou extraordinários) são proibidas. Só se pode gastar no limite da disponibilidade financeira. Esta disponibilidade financeira é fixada pelos CRÉDITOS ORÇAMENTÁRIOS.
c) Não é possível que operações de crédito excedam os limites dos créditos para despesas de capital. Em outras palavras, tem-se que o Estado não pode contrair empréstimos para atender a investimentos, v.g, além do valor fixado para tal despesa. O limite para as operações de crédito para o atendimento de tais despesas é o seu valor, ressalvadas, naturalmente, as despesas que tenham de ser atendidas por créditos suplementares ou especiais (despesas sem crédito suficiente, ou despesas que não haviam sido previstas), desde que autorizados por lei. Neste caso, as despesas de capital poderão ter determinado limite, que poderá ser excedido, desde que sejam verificadas as hipóteses que justifiquem uma autorização legislativa para o uso de mais recursos disponíveis para tais despesas, além daqueles montantes inicialmente previstos.
d) Proibição de vinculação (destinação) da receita de qualquer imposto a fundo ou despesa. Excetuam-se desta proibição: 1) a repartição da receita nos termos definidos pela própria CRFB em seus artigos 158 e 159; 2) ações e serviços públicos de saúde (artigo 198, § 2º, CRFB); 3) manutenção e desenvolvimento do ensino (artigo 212, CRFB); 4) atividades da administração tributária (artigo 37, inciso XXII, CRFB).
e) Todo crédito suplementar ou especial (não se trata, aqui, de créditos extraordinários) deve ser autorizado por lei, e somente pode ser autorizado pelo Poder legislativo, se nesta mesma autorização forem apontadas as fontes dos recursos. Não é possível a atribuição de crédito suplementar ou de crédito especial sem a respectiva identificação de qual será a fonte de custeio desses créditos;
f) Uma vez aprovado o orçamento, não é possível o remanejamento, a transposição ou a transferência dos recursos de uma determinada dotação, reservada para uma determinada despesa, situada em uma categoria de programação, para outra, ou mesmo, uma dotação alocada para despesas de um órgão para outro, salvo se previamente autorizados por lei;
g) Só existem créditos orçamentários para o atendimento de uma determinada despesa, que só pode ser realizada nos limites dos recursos disponíveis, sendo esta a representação da noção de equilíbrio orçamentário proposta pela ordem constitucional brasileira. Assim sendo, não se concebem como possíveis despesas sem limites; assim como também não é possível prever-se créditos sem limites;
h) As empresas estatais, fundações públicas e os fundos especiais podem ter seus déficits de operações cobertos pelos recursos dos orçamentos fiscais e da seguridade social (não há referência, aqui, aos recursos previstos para investimentos), mas este uso de recursos depende de autorização legislativa específica para tal finalidade.
i) Não se proíbe a instituição de fundos (patrimônio vinculado à destinação específica), porém estes devem ter sua instituição autorizada por lei. Não se trata de exigir sua criação por ato legislativo, mas de exigir que o ato de criação decorra de uma autorização prévia, que deve ser legislativa.
j) O pagamento das despesas com pessoal (ativos, inativos e pensionistas) pelos Estados, Distrito-federal e municípios não pode ser efetuado através de transferências voluntárias pela União, ou por empréstimos contraídos por aqueles perante a União para tal finalidade. O resultado da repartição da receita dos impostos pode perfeitamente ser utilizado para o pagamento de folha de pessoal, mas na hipótese em que os recursos se esgotem, não é possível se contrair empréstimo perante instituição financeira da União para esta finalidade.
k) A receita das contribuições da seguridade social só pode ser destinada ao custeio das atividades vinculadas à manutenção dos benefícios. São tributos com destinação específica (não são impostos) e não podem ter qualquer outra destinação. Uma vez alocados no orçamento da seguridade social, receita e despesa não podem ser remanejados, transferidos ou transpostos. Só podem ser destinados a tais finalidades.
l) Todo investimento que tenha de ser executado em período que supere um exercício financeiro só pode ter seu início após prévia inclusão no PPA, e na hipótese em que não o tenha sido oportunamente, deve ter autorização legislativa;
m) Créditos especiais e extraordinários (autorizações para se gastar recursos disponíveis, além das previsões orçamentárias) estão vinculados ao exercício em que foram autorizados, mas se foram autorizados a partir de setembro, seu saldo, se existir, se for reaberto, será reincorporado na LOA do próximo exercício;
n) Os créditos extraordinários não estão sujeitos a limites, uma vez que vinculados a eventos imprevisíveis, relacionados a três causas: guerra, comoção interna e calamidade pública. Podem ser autorizados por medida provisória.
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