domingo, 27 de novembro de 2011

Aula 16

AULA 16

Tema: O regime constitucional dos precatórios.

1. Os elementos do conceito

Precatório ou ofício precatório é o instrumento que representa uma requisição judicial de pagamento, isto é, uma solicitação de pagamento. Esta solicitação está consubstanciada em um ofício requisitório que é expedido pelo juiz da execução de sentença ao Presidente do Tribunal que proferir a decisão exequenda, tendo como causa a circunstância de a Fazenda Pública ter sido condenada ao pagamento de determinada quantia a outrem em processo que tenha transitado em julgado.

Deste conceito, podemos extrair as seguintes características:

a) Elemento material: é um ofício;

b) Função: requisição de um pagamento;

c) Causa: tem origem em uma condenação da pessoa jurídica de Direito Público ao pagamento de determinada quantia a um particular, após o trânsito em julgado de uma decisão judicial;

d) Iniciativa do ofício requisitório: é expedido pelo juiz da execução da sentença condenatória;

e) Quem é o destinatário do ofício? É dirigido ao Presidente do Tribunal a que se encontre vinculado o juízo da execução. Se na justiça comum, será o presidente do Tribunal de Justiça; se no juízo federal, o Presidente do Tribunal Regional Federal;

f) O conteúdo do ofício: Através desse ofício, o presidente do Tribunal requisitará do devedor, no caso, a pessoa jurídica pública, que pode ser o próprio Estado, a União, o município, ou uma de suas entidades da Administração indireta [exceto as sociedades de economia mista], a quantia necessária para a satisfação do débito. Portanto, o presidente do Tribunal expede ordem à pessoa jurídica para que inclua em sua programação orçamentária o valor correspondente àquela condenação;

g) Natureza jurídica da atividade: Trata-se de atividade de natureza administrativa e não judicial, veiculando tão somente um procedimento administrativo de quitação do débito.

2. O regime constitucional dos pagamentos

O regime jurídico dos precatórios está vinculado, basicamente, ao texto do artigo 100, §§ 1º a 16, da CRFB de 1988, com a redação modificada pela EC n. 62, de 9 de dezembro de 2009, que segue transcrito:

“Art. 100. Os pagamentos devidos pelas Fazendas Públicas Federal, Estaduais, Distrital e Municipais, em virtude de sentença judiciária, far-se-ão exclusivamente na ordem cronológica de apresentação dos precatórios e à conta dos créditos respectivos, proibida a designação de casos ou de pessoas nas dotações orçamentárias e nos créditos adicionais abertos para este fim.

§ 1º Os débitos de natureza alimentícia compreendem aqueles decorrentes de salários, vencimentos, proventos, pensões e suas complementações, benefícios previdenciários e indenizações por morte ou por invalidez, fundadas em responsabilidade civil, em virtude de sentença judicial transitada em julgado, e serão pagos com preferência sobre todos os demais débitos, exceto sobre aqueles referidos no § 2º deste artigo.

§ 2º Os débitos de natureza alimentícia cujos titulares tenham 60 (sessenta) anos de idade ou mais na data de expedição do precatório, ou sejam portadores de doença grave, definidos na forma da lei, serão pagos com preferência sobre todos os demais débitos, até o valor equivalente ao triplo do fixado em lei para os fins do disposto no § 3º deste artigo, admitido o fracionamento para essa finalidade, sendo que o restante será pago na ordem cronológica de apresentação do precatório.

§ 3º O disposto no caput deste artigo relativamente à expedição de precatórios não se aplica aos pagamentos de obrigações definidas em leis como de pequeno valor que as Fazendas referidas devam fazer em virtude de sentença judicial transitada em julgado.

§ 4º Para os fins do disposto no § 3º, poderão ser fixados, por leis próprias, valores distintos às entidades de direito público, segundo as diferentes capacidades econômicas, sendo o mínimo igual ao valor do maior benefício do regime geral de previdência social.

§ 5º É obrigatória a inclusão, no orçamento das entidades de direito público, de verba necessária ao pagamento de seus débitos, oriundos de sentenças transitadas em julgado, constantes de precatórios judiciários apresentados até 1º de julho, fazendo-se o pagamento até o final do exercício seguinte, quando terão seus valores atualizados monetariamente.

§ 6º As dotações orçamentárias e os créditos abertos serão consignados diretamente ao Poder Judiciário, cabendo ao Presidente do Tribunal que proferir a decisão exequenda determinar o pagamento integral e autorizar, a requerimento do credor e exclusivamente para os casos de preterimento de seu direito de precedência ou de não alocação orçamentária do valor necessário à satisfação do seu débito, o sequestro da quantia respectiva.

§ 7º O Presidente do Tribunal competente que, por ato comissivo ou omissivo, retardar ou tentar frustrar a liquidação regular de precatórios incorrerá em crime de responsabilidade e responderá, também, perante o Conselho Nacional de Justiça.

§ 8º É vedada a expedição de precatórios complementares ou suplementares de valor pago, bem como o fracionamento, repartição ou quebra do valor da execução para fins de enquadramento de parcela do total ao que dispõe o § 3º deste artigo.

§ 9º No momento da expedição dos precatórios, independentemente de regulamentação, deles deverá ser abatido, a título de compensação, valor correspondente aos débitos líquidos e certos, inscritos ou não em dívida ativa e constituídos contra o credor original pela Fazenda Pública devedora, incluídas parcelas vincendas de parcelamentos, ressalvados aqueles cuja execução esteja suspensa em virtude de contestação administrativa ou judicial.

§ 10. Antes da expedição dos precatórios, o Tribunal solicitará à Fazenda Pública devedora, para resposta em até 30 (trinta) dias, sob pena de perda do direito de abatimento, informação sobre os débitos que preencham as condições estabelecidas no § 9º, para os fins nele previstos.

§ 11. É facultada ao credor, conforme estabelecido em lei da entidade federativa devedora, a entrega de créditos em precatórios para compra de imóveis públicos do respectivo ente federado.

§ 12. A partir da promulgação desta Emenda Constitucional, a atualização de valores de requisitórios, após sua expedição, até o efetivo pagamento, independentemente de sua natureza, será feita pelo índice oficial de remuneração básica da caderneta de poupança, e, para fins de compensação da mora, incidirão juros simples no mesmo percentual de juros incidentes sobre a caderneta de poupança, ficando excluída a incidência de juros compensatórios.

§ 13. O credor poderá ceder, total ou parcialmente, seus créditos em precatórios a terceiros, independentemente da concordância do devedor, não se aplicando ao cessionário o disposto nos §§ 2º e 3º.

§ 14. A cessão de precatórios somente produzirá efeitos após comunicação, por meio de petição protocolizada, ao tribunal de origem e à entidade devedora.

§ 15. Sem prejuízo do disposto neste artigo, lei complementar a esta Constituição Federal poderá estabelecer regime especial para pagamento de crédito de precatórios de Estados, Distrito Federal e Municípios, dispondo sobre vinculações à receita corrente líquida e forma e prazo de liquidação.

§ 16. A seu critério exclusivo e na forma de lei, a União poderá assumir débitos, oriundos de precatórios, de Estados, Distrito Federal e Municípios, refinanciando-os diretamente."(NR).”

É importante salientar que seu fundamento reside no princípio da impenhorabilidade dos bens públicos, princípio que já foi exposto logo ao início de nossas aulas, quando tratamos das formas de obtenção de receita por iniciativa do Estado.

3. O procedimento de pagamento

Na execução por quantia certa contra a Fazenda Pública, esta [a entidade de Direito público] será citada para impugnar a execução, deduzindo a ação de embargos, no prazo de trinta dias, nos termos do artigo 730, caput, do CPC.

É importante salientar que este regime de quitação dos débitos que tenham causa em condenação judicial, alcança tão somente a própria pessoa jurídica política [União, Estados, Distrito-federal e municípios] ou ainda, as entidades que integrem a Administração indireta, excluídas aquelas que explorem atividade econômica. As que prestem serviços públicos também seriam citadas para impugnar a execução, no prazo de trinta dias.

Se a entidade não opuser os embargos no prazo legal, nos termos do artigo 730 e respectivos incisos, do CPC, o juízo requisitará o pagamento por intermédio do presidente do Tribunal competente, e este o fará perante o Poder Executivo, que efetuará o pagamento na ordem de apresentação do precatório e à conta do respectivo crédito.

Uma vez transitada em julgado a decisão condenatória e expedido o ofício pelo juízo da execução, o Tribunal determinará à entidade pública que inclua a verba necessária e suficiente para a quitação do precatório. O tribunal deve apresentar ao Poder Executivo a relação com todos os precatórios que tenham sido apresentados até o dia 1º de julho, para que sejam pagos até o final do exercício financeiro seguinte (artigo 100, § 1º, CRFB).

A atualização monetária deverá ser feita por ocasião do pagamento. Isto quer dizer que o Poder Público sempre tem, no mínimo, um ano e meio para o pagamento dos precatórios. Os que forem apresentados a partir do dia 2 de julho somente poderão ser incluídos na programação orçamentária no ano seguinte, visando atender o exercício posterior.

Sendo mais específico, teríamos a seguinte situação:

a) Precatórios apresentados de 2 de julho de 2011 até 1 de julho de 2012: deverão ser pagos até o fim do exercício de 2012, sendo incluídos já na programação orçamentária de 2011, que será encaminhada até o último dia do mês de agosto;

b) Precatórios apresentados entre 2 de julho de 2012 e 1 de julho de 2013: deverão ser pagos até o fim do exercício de 2013, porque só poderão ser incluídos na programação orçamentária de 2012.

Em síntese, temos que:

a) O juízo da execução expedirá o ofício requisitório ao Tribunal;

b) O tribunal requisitará do Poder Executivo, que inclua em sua programação orçamentária, a quantia correspondente à dívida, devendo respeitar o prazo de 1º de julho, como limite para que se possa exigir do Poder Executivo, que inclua na programação orçamentária em elaboração, a quantia exequenda. Incluindo nessa programação, o valor terá de ser liquidado no próximo exercício, pois esse é o termo de vigência do orçamento sob elaboração;

c) Cabe ao presidente do tribunal, encaminhar ao Poder Executivo, a relação completa de todos os precatórios que tenha recebido, até o dia 1º de julho, visando assegurar a inclusão nos termos já descritos.

Note-se que a escolha da data de 1º de julho como limite para que o Tribunal entregue a relação de precatórios à autoridade competente do Poder Executivo tem sua justificativa no regime de programação orçamentária em vigor.

Conforme já foi analisado, de acordo com o art. 35, § 2º, inciso III do ADCT, o projeto de LOA será encaminhado pelo chefe do Poder Executivo ao Legislativo até o dia 31 de agosto. Este é o interstício [1º de julho a 31 de agosto] considerado como suficiente para que o Poder Executivo promova a reorganização de sua programação orçamentária, visando atender a necessidade de satisfazer os débitos apresentados, de modo que a LOA possa suportar o pagamento dos precatórios no decorrer do próximo exercício.

IMPORTANTE: A jurisprudência tem considerado que a data de 1º de julho não seria a data limite para que o Tribunal entregasse a relação de precatórios à autoridade competente do Poder Executivo, senão a data limite para que o juízo da execução entregue o ofício ao Presidente do Tribunal. Dessa forma, todos os ofícios requisitórios que fossem entregues ao presidente do respectivo Tribunal até 1º de julho, teriam de ser pagos pela pessoa jurídica, mesmo que apresentados pelo Tribunal após aquele prazo. Teriam de incluir em sua programação orçamentária para pagamento no final do próximo exercício.

4. A dotação orçamentária para pagamento de precatórios

Segundo o caput do art. 100 da CRFB, os pagamentos dos precatórios serão feitos “exclusivamente na ordem cronológica de apresentação dos precatórios e à conta dos créditos respectivos, proibida a designação de casos ou de pessoas nas dotações orçamentárias e nos créditos adicionais abertos para esse fim”. Isso significa que o valor correspondente ao montante dos precatórios apresentados deverá ser consignado através de dotações orçamentárias realizadas de forma genérica [sem designação de casos ou pessoas] e diretamente na LOA ou em lei que autorize a abertura de créditos adicionais [especiais ou suplementares, no caso em que não tenha sido possível a inclusão oportuna na LOA, ou em que os créditos já consignados na LOA não tenham sido suficientes para tal finalidade] para o fim de pagamento de precatórios.

Já o § 6º, do mesmo art. 100, primeira parte, preceitua:

“As dotações orçamentárias e os créditos abertos serão consignados diretamente ao Poder Judiciário, cabendo ao Presidente do Tribunal que proferir a decisão exequenda determinar o pagamento integral e autorizar, a requerimento do credor e exclusivamente para os casos de preterimento de seu direito de precedência ou de não alocação orçamentária do valor necessário à satisfação do seu débito, o sequestro da quantia respectiva.”.

Isso não significa que os créditos serão atribuídos à dotação orçamentária do Poder Judiciário. O texto propõe tão somente que os recursos financeiros destinados ao pagamento de precatórios estarão disponíveis ao Poder Executivo [federal, estadual, distrital ou municipal], integrando a dotação orçamentária do próprio Poder Executivo.

Entretanto a finalidade de tais recursos, previstos na programação orçamentária do Poder Executivo, têm por destinatário o Poder Judiciário devendo ser depositados em conta específica de titularidade do Tribunal, destinada a tal finalidade específica. Portanto, os recursos programados e alocados em dotação do Poder Executivo, somente poderão ser destinados ao pagamento de precatórios, que serão realizados pelo Poder Judiciário, destinatário daqueles recursos, que serão transferidos à conta específica do Tribunal, para tal finalidade. Saliente-se que, o que precisa ficar claro é que esses valores em hipótese alguma irão compor a programação orçamentária do Poder Judiciário. São recursos que serão repassados a esta função pública, para que efetue o pagamento.

5. A ordem cronológica de apresentação dos precatórios

Uma das regras mais importantes quanto ao procedimento dos precatórios, diz respeito à ordem cronológica que deve ser respeitada para que os pagamentos sejam efetuados.

Conforme previsto pelo caput do art. 100, da CRFB e pelo artigo 67, da lei 4.320/64, o pagamento dos precatórios deve ser realizado exclusivamente na ordem cronológica de apresentação dos ofícios requisitórios de pagamento emitidos pelo juiz da execução no protocolo do Tribunal competente.

Essa regra tem por objetivo a proteção da garantia constitucional de igualdade e, sobretudo, a proteção do princípio constitucional da impessoalidade, que vincula a Administração Pública, nos termos do artigo 37, caput, da CRFB e que propõe a necessidade de que as funções públicas atinjam suas finalidades, segundo critérios de imparcialidade, proporcionando igual proteção à satisfação dos créditos que existam perante a pessoa jurídica pública, independente de condições de diferenciação pessoal ou de quaisquer natureza.

A ordem cronológica também atende a outros princípios que vinculam a Administração Pública, expressos no texto do artigo 37, caput, sendo também reforçada as dimensões da moralidade e, naturalmente, da legalidade.

A EC n. 62/2009 propôs uma flexibilização da regra que vigia até então, fixando duas hipótses de preferência de natureza subjetiva para o fim de justificar a aceleração do procedimento de satisfação dos créditos, independente de sua natureza. Em sua nova redação, o artigo 100, § 2º, da CRFB, os portadores de doenças graves e os maiores de 60 anos deverão ter seus créditos satisfeitos com prioridade para os valores que não superem o triplo daqueles fixados para o pagamento por requisições de pequeno valor (RPV), sendo possível que proponham o fracionamento do precatório para esta finalidade. Os valores remanescentes encontram-se excluídos da preferência e deverão atender às mesmas regras que orientam a proteção da ordem cronológica, aplicando-se, portanto, os regimes distintos de acordo com a natureza objetiva do crédito a ser satisfeito (créditos comuns e créditos alimentares).

Confira-se, por oportuno, o destaque do dispositivo, que segue transcrito:

"Art. 100.

[...]

§ 2º Os débitos de natureza alimentícia cujos titulares tenham 60 (sessenta) anos de idade ou mais na data de expedição do precatório, ou sejam portadores de doença grave, definidos na forma da lei, serão pagos com preferência sobre todos os demais débitos, até o valor equivalente ao triplo do fixado em lei para os fins do disposto no § 3º deste artigo, admitido o fracionamento para essa finalidade, sendo que o restante será pago na ordem cronológica de apresentação do precatório."

6. As conseqüências do descumprimento da ordem cronológica e da não inclusão de precatórios na programação orçamentária

Neste tema, é importante distinguir DUAS SITUAÇÕES DISTINTAS referentes à violação do regime jurídico dos pagamentos decorrentes de condenações judiciais atribuídos à Administração Pública.

A PRIMEIRA delas propõe a preterição do credor na ordem cronológica dos pagamentos, quando credor situado em posição mais desfavorável recebe seus créditos em detrimento daquele que se encontrava em posição mais vantajosa na ordem cronológica. Neste caso, o texto do artigo 100, § 6º, da CRFB, autoriza que o presidente do Tribunal, a requerimento do credor, promova o sequestro da quantia necessária a satisfação do crédito preterido.

A SEGUNDA propõe a não inclusão da verba na programação orçamentária, mesmo tendo sido requisitado pelo Tribunal competente. Neste caso, está-se diante da hipótese descrita no texto do artigo 34, inciso VI, da CRFB, que disciplina a possibilidade de intervenção da União sobre os Estados e Distrito federal, e dos Estados sobre os municípios, para garantir a execução de ordem judicial.

Entretanto, não é suficiente, conforme orienta a jurisprudência do STF, que se tenha a descrição de um estado de fato que revele a não inclusão dos recursos, sendo indispensável que se demonstre, para o fim de justificar a subtração temporária da autonomia do ente federado, a voluntariedade no descumprimento. Portanto, sempre que for possível demonstrar que, o cumprimento de tais decisões e o pagamento dos precatórios pudesse comprometer gravemente a execução das atividades regulares do ente federado, e o funcionamento regular de seus serviços e tarefas e, portanto, a impossibilidade real de que tais decisões fossem cumpridas, sob pena de grave comprometimento da ordem pública, não seria possível autorizar a intervenção (Rcl n. 2155/RJ. Rel. Min. Gilmar Mendes, DJU de 18.03.2005; IF n. 3124/ES, Rel. Min. Maurício Corrêa, DJU de 28.05.2004).

Portanto, não é possível o sequestro tendo por fundamento a ausência de pagamento, exceto na hipótese do artigo 74, § 4º, do ADCT [este dispositivo trata de hipóteses de parcelamento de precatórios e será analisado posteriormente], porque:

a) O sequestro previsto no caso do artigo 100, § 6º, da CRFB tem como causa a seguinte situação: O recurso já existe na programação orçamentária do Poder Executivo, foi transferido para a conta sob a administração do Tribunal de Justiça e foi utilizado para o pagamento de precatório de beneficiário situado em posição mais desfavorável na ordem cronológica. Vale para o pagamento de precatórios de quaisquer natureza, parcelados ou não. O sequestro se dá sobre os recursos que já estão em poder da função judiciária;

b) O sequestro previsto no artigo 78, § 4º, do ADCT só alcança precatórios ditos comuns, que tenham sido objeto de parcelamento e têm como causa o atraso no pagamento, omissão de inclusão no orçamento e preterição na ordem cronológica. O sequestro se dá sobre os recursos ainda em poder da função executiva.

7. Os créditos de natureza alimentícia

É importante consignar aqui, que o caput do art. 100, da CRFB, excetua os créditos de natureza alimentícia da ordem cronológica dos pagamentos dos precatórios. Entretanto, isto não quer dizer que tais créditos não se submeterão ao regime dos precatórios, mas, apenas que possuem absoluta prioridade sobre os créditos sem especificação, tal como se encontra consolidado no enunciado da súmula n. 655, do STF, cujo texto segue transcrito:

“Súmula 655. A exceção prevista no art. 100, caput, da Constituição, em favor dos créditos de natureza alimentícia, não dispensa a expedição de precatório, limitando-se a isentá-los da observância da ordem cronológica dos precatórios decorrentes de condenações de outra natureza.”

Isso se justifica pelo fato de tais créditos serem os imprescindíveis à subsistência do credor e de sua família, não sendo exigível e tampouco razoável submetê-lo a processo especial de quitação em simetria com créditos de naturezas tão distintas quanto diversas. Estes créditos têm sua definição no texto da própria CRFB, que previu em seu artigo 100, § 1º (com a redação atribuída pela EC n. 62/2009):

“Art. 100

[...]

§ 1º Os débitos de natureza alimentícia compreendem aqueles decorrentes de salários, vencimentos, proventos, pensões e suas complementações, benefícios previdenciários e indenizações por morte ou por invalidez, fundadas em responsabilidade civil, em virtude de sentença judicial transitada em julgado, e serão pagos com preferência sobre todos os demais débitos, exceto sobre aqueles referidos no § 2º deste artigo."

O art. 78, do ADCT, apresenta uma hipótese de parcelamento de precatórios, conforme veremos a seguir.

O texto da EC n. 37/2002, trouxe uma exceção à impossibilidade de parcelamento dos créditos de natureza alimentícia. O § 2º, do art. 86, do ADCT, prevê que, nos casos de tais débitos serem de pequeno valor e estarem enquadrados nas condições previstas nos incisos do caput deste artigo, estes poderão ser pagos em duas parcelas anuais, na forma disciplinada na lei (§ 3º).

8. O parcelamento de precatórios

Como regra geral, o parcelamento só é admitido para os precatórios que, na data da promulgação da EC n. 30/2000, estivessem pendentes de pagamento, ou para os precatórios que decorram de ações propostas até o dia 31 de dezembro de 1999. Neste caso, o artigo 78, caput, do ADCT propõe que esses créditos poderiam ser parcelados em prestações iguais e anuais, no prazo de dez anos, pelo seu valo real, em moeda corrente e acrescidos dos juros legais.

O texto excepciona do parcelamento as obrigações que sejam definidas pela lei como de pequeno valor [pagas através de requisições, conforme será analisado posteriormente], os créditos alimentícios, e os constantes do artigo 33, do ADCT, que já previa uma hipótese de parcelamento, no prazo máximo de oito anos, até 1º de julho de 1989, dos precatórios que estivessem pendentes de pagamento até a promulgação da CRFB de 1988.

Convém registrar que o artigo 78, caput e seus respectivos parágrafos, do ADCT foi impugnado pela ADI n. 2356-0/DF, na qual foram propostos, entre outros argumentos, a afirmação de violação do princípio da igualdade e do Estado de direito, que, situados na condição de cláusulas de intangibilidade, não poderiam ser objeto de intervenção. Entretanto a ADI encontra-se neste momento, pendente de pronunciamento conclusivo, após pedido de vistas do ministro Cezar Peluso, após terem votado O Ministro Néri da Silveira, Ellen Gracie e Carlos Brito, no sentido de reconhecer liminarmente a inconstitucionalidade da expressão “e os que decorram de ações judiciais ajuizadas até 31 de dezembro de 1999”. Declarou-se impedido o ministro Gilmar Mendes, e votaram pelo indeferimento os ministros Eros Grau e Joaquim Barbosa.

9. As requisições de pequeno valor

Até o momento, foi dito que o regime constitucional de pagamento dos precatórios prevê a existência de duas ordens cronológicas: a da quitação das obrigações decorrentes de créditos alimentícios e a dos demais créditos.

Entretanto, nem todas as obrigações decorrentes de condenações judiciais sujeitam o credor ao regime especial de pagamento das obrigações das pessoas jurídicas públicas, sendo este o caso das obrigações que sejam definidas pela lei, na condição de pequeno valor, conforme orienta o artigo 100, § 3º, da CRFB.

Estas são definidas pelo texto do artigo 97, § 12, do ADCT, sendo possível que sejam definidas em valores distintos aos que serão descritos na sequência, de acordo com a capacidade financeiras dos entes públicos, valores estes que nunca poderão ser inferiroes ao maior valor de benefício do regime geral de Previdência Social (artigo 100, § 4º, CRFB):

a) em relação aos Estados e Distrito Federal, são as obrigações iguais ou inferior a 40 salários mínimos;

b) em relação aos municípios, são aquelas de valor igual ou inferior a 30 salários mínimos.

Os valores relativos à União estão definidos na lei n. 10.259/2001, que instituiu os juizados especiais federais, fixando o limite de 60 salários mínimos para as obrigações definidas como de pequeno valor.

Ressalte-se que cada ente federado poderá, por sua iniciativa legislativa, definir valores distintos dos que foram fixados no artigo 97, do ADCT, conforme autoriza o artigo 100, § 5º, da CRFB, sendo possível reproduzir, como exemplo, o ocorrido no julgamento da ADI n. 2868/PI, que julgou improcedente a ação na qual se pretendia a declaração de inconstitucionalidade de texto estadual que fixava para o Estado do Piauí o limite de 5 salários mínimos para o fim de definição das obrigações de pequeno valor.

Em todo caso, estas obrigações não estão sujeitas ao regime de pagamento através de precatórios, sendo pagas diretamente pelo Poder Público ao particular, através de RPV.

10. O fracionamento dos precatórios

O texto do artigo 100, § 8º, da CRFB veda expressamente a possibilidade de fracionamento, repartição, expedição de precatórios complementares ou suplementares, ou quaisquer formas de se quebrar o valor da execução para o fim de que parte do crédito seja satisfeito através de requisições de pequeno valor, e outra parte, através da expedição de precatório.

Exceção pode ser identificada no § 11 do artigo 97, do ADCT, que assegura a possibilidade de fracionamento tão somente nas hipóteses em que se tenham credores em litisconsórcio, casos em que cada um dos credores poderá requerer o desmembramento perante o Tribunal que processa o precatório, para o fim de habilitar o valor devido a cada um dos credores.

11. O regime especial de pagamento regulado pelo artigo 97, do ADCT.

Apenas para o fim de encerramento desta abordagem introdutória, convém registrar que a EC n. 62/2009 também modificou o texto do artigo 97, do ADCT, para assegurar a todos os entes federativos a opção por regime especial de pagamento dos créditos de precatórios enquanto não for publicada a LC de que trata o § 15, do artigo 100, da CRFB.

Este regime propõe, basicamente, que uma vez realizada a opção pelos entes federativos, estes possam realizar o pagamento dos créditos, durante o prazo máximo de 15 anos, por meio de regras especiais que protejam a capacidade financeira dos entes de eventual hipótese de exaustão. Para tanto, proporciona duas possibilidades para a quitação.

Pela primeira (para a qual não se aplica o prazo de 15 anos), em sendo os créditos superiores aos recursos disponíveis para tal finalidade, seja comprometida apenas parte da receita corrente líquida, em percentuais que se diferenciam nos termos do § 1, incisos I e II, para Estados e municípios. Estes valores são recolhidos em conta especial administrada pelo presidente do Tribunal.

Convém assinalar que 50% dos valores recolhidos destinam-se ao pagamento dos créditos em ordem cronológica de apresentação, e os valores remanescentes terão de atender ao pagamento à vista dos créditos ainda não quitados pela ordem, ao pagamento em razão de leilões dos créditos, e à celebração de acordos com os credores.

A segunda possibilidade é, de fato, o regime especial, por meio do qual, durante 15 anos, os entes federados deverão destinar, em conta especial, o importe total dos créditos que devam ser quitados no exercício financeiro respectivo, acrescidos apenas e tão somente da correção oriunda da caderneta de poupança, excluídos os juros compensatórios, e por meio de destinação mensal no importe de 1/12 do total do crédito.

No caso em que não sejam destinados, oportunamente, os recursos para a execução do regime especial, será possível o sequestro das quantias existentes nas contas dos entes federados, por ordem do presidente do Tribunal, e tão somente para atender à garantia dos créditos, portanto, até o limite dos valores que deveriam ter sido liberados e não foram. Saliente-se que esta medida se justifica tão somente na hipótese em que os recursos não foram liberados oportunamente. Caso contrário, enquanto se encontrar em execução o regime especial, o ente credor não poderá ser objeto do sequestro.

O artigo 97 ainda assegura, por meio de seu § 10, inciso II, o poder liberatório de tributos devidos perante os entes devedores, de forma automática e independente de regulamentação normativa prévia.

O mesmo dispositivo ainda vincula o gestor a um conjunto de severas restrições enquanto permanecer inadimplente, não sendo possível, do teor do inciso III, que venha contrair empréstimos internos ou externos, ou receber transferências voluntárias.

Da mesma forma, também não poderá fazer o uso dos valores relativos aos Fundos de Participação (Estados, Distrito Federal e Municípios), uma vez que esses valores serão recolhidos pela União para o fim de destiná-los às contas especiais, posicionando-os como garantia dos créditos ainda não quitados.

Indicações bibliográficas

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