domingo, 27 de novembro de 2011

Aula 17

AULA 17

Tema: Controle e a fiscalização da atividade orçamentária. As modalidades de controle. Os Tribunais de Contas.

IMPORTANTE: Todos os recursos obtidos pelo Estado, seja por sua própria iniciativa, fazendo o uso de seu próprio patrimônio, ou principalmente pela constrição do patrimônio dos particulares, quando convertidos em despesas, devem assegurar que, no plano da realidade fática, cada um dos atos que justifica tais despesas, possa primeiro, produzir conseqüências. Portanto, não é possível conceber o uso de recursos sem resultados. Todo uso de recurso público deve implicar em atos materiais, modificações concretas na vida de cada um de nós. Sob esta perspectiva, também não é suficiente que aqueles usos atendam quaisquer espécies de conseqüências. Os resultados somente podem ser aqueles que atendam a finalidades de interesse público. Temos aqui, concretamente, a necessidade de que cada causa que foi apontada para justificar uma determinada despesa tenha de assegurar benefícios materiais, utilidades, serviços, obras, prestações, melhoria na qualidade de vida.

De acordo com o uso que se destine aos recursos, ter-se-á melhor ou pior qualidade de vida assegurada aos membros da coletividade.

Tomemos alguns exemplos para ilustrar essa afirmação:

a) Uma vistoria que tenha de ser realizada em um hospital público. Um servidor tem diárias pagas pelo Estado, um motorista as terá também. O combustível será custeado com recursos públicos, abrangendo o trajeto de ida e volta. No retorno, o servidor não elabora relatório ou qualquer análise da situação. A despesa foi realizada, mas não se verificou qualquer conseqüência útil dessa despesa. Qual era a utilidade e a necessidade da vistoria? Colher informações sobre o uso dos bens, se os atendimentos estão sendo prestados, se os médicos comparecem, se as compras são eficientes, se os recursos para compras são bem utilizados, se as melhores propostas conseguem ser obtidas, se há o uso racional e econômico desses recursos. Se nada disso foi conseguido, na forma de um relatório, aquela despesa não teve qualquer utilidade.

b) Uma determinada reunião, singela, com um grupo de servidores públicos, para a qual não se tenha pauta prévia, ou que não seja conduzida com objetividade. A eletrecidade, a ausência do servidor para suas tarefas rotineiras, o tempo adicional que terá de ser empregado para sua realização, a deficiência no atendimento ao público, que será prejudicado pela ausência daquele servidor. Tudo isso representa um conjunto de custos que deixa de cumprir qualquer finalidade útil, seja mediata ou imediata.

A conjugação de pequenos custos, desperdícios, atrasos, representa ao fim de um ciclo orçamentário, conseqüências que não são apenas de desequilíbrio financeiro, ou em outras palavras: as conseqüências não se dão apenas no plano formal, de uma programação. Elas são reais. Alguma necessidade, serviço, utilidade ou comodidade deixará de ser atendida. Isto se dá no plano da proteção insuficiente ou deficiente de direitos fundamentais. Saúde, moradia, emprego, segurança, trabalho. São prestações que poderão ser afetadas por decisões, escolhas, ou comportamentos deficientes na execução orçamentária.

c) Tomemos outro exemplo mais singelo ainda, para ilustrar esta realidade: a execução das obras do PAC. O atraso na elaboração de novos editais quando já enviada proposta orçamentária, expõe a possibilidade de sua não inclusão no orçamento do próximo exercício, análise da possibilidade da abertura de créditos especiais, que representa atraso na execução da obra, e que gera conseqüências para o usuário, e para o beneficiário dos efeitos dessas ações, o particular e a coletividade.

d) Um outro exemplo do cotidiano que também bem poderia enfatizar o conjunto dos problemas propostos está na intervenção sobre as vias públicas, visando assegurar como resultado, a melhoria da mobilidade urbana. Uma ação pública que não seja precedida de planejamento ou de análise de todas as alternativas que pudessem ser viáveis para solucionar o problema específico de mobilidade conduz necessariamente à realização de despesas baseadas em um juízo meramente empírico. O mesmo ocorre com o recebimento de obra com qualidade construtiva deficiente. Ambas as situações representam, concretamente, a realização de obras que poderão ser revistas de acordo com a demonstração, no plano fático, de seu sucesso ou fracasso, ou ainda, que exigirão o incremento de recursos para que possam atender às finalidades inicialmente requeridas pelo projeto (este é o caso do segundo exemplo, de obras atingidas por falhas em sua execução). A ausência de um prognóstico que não se fundamente em um conjunto de informações, dados ou de conhecimento, do modo mais completo que seja possível naquele momento, é capaz de produzir prejuízos significativos às expectativas e a um modelo de projeto de vida delineado pelo chefe do Executivo em sua programação orçamentária. Despesas realizadas de forma ineficiente ou que não sejam capazes de propor medidas e soluções eficazes para os problemas ou para remover os obstáculos à qualidade de vida, influenciam no agravamento do estado de escassez de recursos que constitui o ponto-de-partida das escolhas orçamentárias.

Este é o contexto que justifica a importância da última fase do assim denominado ciclo orçamentário, o do controle da execução. Da correta aplicação e a destinação e, sobretudo, da destinação eficiente, econômica, legítima das receitas depende a garantia de melhores ou piores condições de qualidade de vida, no contexto de um Estado que é social e democrático de Direito;

e) Como dois últimos exemplos ainda poderiam ser citados: a aquisição de um tapete no valor de R$ 6.000,00 por determinada entidade da Administração Pública, mediante compra-direta, e a aquisição por uma determinada Secretaria de Estado, de cinco cadeiras no valor unitário de R$ 7.000,00.

Temos nesta aula, a análise dos instrumentos destinados a assegurar que esta qualidade de vida possa ser atingida. O resultado qualidade de vida foi apenas proposto pro uma programação orçamentária, na medida em que seria o resultado direto e indireto das escolhas realizadas pelo chefe do poder executivo para o próximo exercício. Entretanto, depende de sua correta execução a concretização do resultado pretendido. Daí a importância da atividade analisada nesta aula. Isto é realizado internamente, por cada órgão, entidade ou poder, e no plano externo. No plano interno, isto se dá em relação aos atos preparatórios da despesa, durante a execução e mesmo após sua efetiva realização. Vide o exemplo da contratação de uma obra pública. Antes da execução, deve-se verificar se o procedimento licitatório ocorreu e corretamente. Posteriormente, se a obra está ou esteve sendo executada. Se a obra foi ou está sendo executada, terá de ser recebida por etapas, e toda a documentação que demonstre e comprove esta execução servirá para confirmá-la na fase de liquidação. Por fim, confirmada, será ordenado seu pagamento e extinta a obrigação, realizando-se a despesa. Depois de sua realização, o processo também será analisado. Deste modo, a qualquer tempo do processo, os atos se encontram sujeitos ao controle e à fiscalização.

O regime constitucional da fiscalização da atividade orçamentária

Retomando a noção de ciclo orçamentário, encerra-se aqui o conjunto de fases vinculadas à exposição da atividade de planejamento estatal de suas atividades, sob a perspectiva orçamentária, que foi iniciada com a organização e preparação das propostas de planos, visando submetê-las ao parlamento, seguida da execução desses planos [momento em que as despesas previstas serão realizadas], e encerrando-se com o controle e a fiscalização dessa execução [observe-se, nesse sentido, o título VIII, capítulo II, da lei n. 4.320/64], visando analisar se e até que ponto, os planos propostos e aprovados pelo parlamento foi cumprido pelo Poder Executivo, e por todos os Poderes, e porque razão não foi possível cumpri-los.

A organização das funções de controle e fiscalização encontra-se reunida no texto constitucional ao longo do artigo 70 usque 75, que propõem um regime que especifica:

a) O alcance da atividade de controle e fiscalização;

b) A forma de fiscalização e os modelos;

c) Os responsáveis pelo exercício de tais funções;

d) Os destinatários das atividades de controle e de fiscalização.

Este é o texto das normas referidas:

Art. 70. A fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da União e das entidades da administração direta e indireta, quanto à legalidade, legitimidade, economicidade, aplicação das subvenções e renúncia de receitas, será exercida pelo Congresso Nacional, mediante controle externo, e pelo sistema de controle interno de cada Poder.

Parágrafo único. Prestará contas qualquer pessoa física ou jurídica, pública ou privada, que utilize, arrecade, guarde, gerencie ou administre dinheiros, bens e valores públicos ou pelos quais a União responda, ou que, em nome desta, assuma obrigações de natureza pecuniária. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

Art. 71. O controle externo, a cargo do Congresso Nacional, será exercido com o auxílio do Tribunal de Contas da União, ao qual compete:

I - apreciar as contas prestadas anualmente pelo Presidente da República, mediante parecer prévio que deverá ser elaborado em sessenta dias a contar de seu recebimento;

II - julgar as contas dos administradores e demais responsáveis por dinheiros, bens e valores públicos da administração direta e indireta, incluídas as fundações e sociedades instituídas e mantidas pelo Poder Público federal, e as contas daqueles que derem causa a perda, extravio ou outra irregularidade de que resulte prejuízo ao erário público;

III - apreciar, para fins de registro, a legalidade dos atos de admissão de pessoal, a qualquer título, na administração direta e indireta, incluídas as fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público, excetuadas as nomeações para cargo de provimento em comissão, bem como a das concessões de aposentadorias, reformas e pensões, ressalvadas as melhorias posteriores que não alterem o fundamento legal do ato concessório;

IV - realizar, por iniciativa própria, da Câmara dos Deputados, do Senado Federal, de Comissão técnica ou de inquérito, inspeções e auditorias de natureza contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial, nas unidades administrativas dos Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário, e demais entidades referidas no inciso II;

V - fiscalizar as contas nacionais das empresas supranacionais de cujo capital social a União participe, de forma direta ou indireta, nos termos do tratado constitutivo;

VI - fiscalizar a aplicação de quaisquer recursos repassados pela União mediante convênio, acordo, ajuste ou outros instrumentos congêneres, a Estado, ao Distrito Federal ou a Município;

VII - prestar as informações solicitadas pelo Congresso Nacional, por qualquer de suas Casas, ou por qualquer das respectivas Comissões, sobre a fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial e sobre resultados de auditorias e inspeções realizadas;

VIII - aplicar aos responsáveis, em caso de ilegalidade de despesa ou irregularidade de contas, as sanções previstas em lei, que estabelecerá, entre outras cominações, multa proporcional ao dano causado ao erário;

IX - assinar prazo para que o órgão ou entidade adote as providências necessárias ao exato cumprimento da lei, se verificada ilegalidade;

X - sustar, se não atendido, a execução do ato impugnado, comunicando a decisão à Câmara dos Deputados e ao Senado Federal;

XI - representar ao Poder competente sobre irregularidades ou abusos apurados.

§ 1º - No caso de contrato, o ato de sustação será adotado diretamente pelo Congresso Nacional, que solicitará, de imediato, ao Poder Executivo as medidas cabíveis.

§ 2º - Se o Congresso Nacional ou o Poder Executivo, no prazo de noventa dias, não efetivar as medidas previstas no parágrafo anterior, o Tribunal decidirá a respeito.

§ 3º - As decisões do Tribunal de que resulte imputação de débito ou multa terão eficácia de título executivo.

§ 4º - O Tribunal encaminhará ao Congresso Nacional, trimestral e anualmente, relatório de suas atividades.

Art. 72. A Comissão mista permanente a que se refere o art. 166, §1º, diante de indícios de despesas não autorizadas, ainda que sob a forma de investimentos não programados ou de subsídios não aprovados, poderá solicitar à autoridade governamental responsável que, no prazo de cinco dias, preste os esclarecimentos necessários.

§ 1º - Não prestados os esclarecimentos, ou considerados estes insuficientes, a Comissão solicitará ao Tribunal pronunciamento conclusivo sobre a matéria, no prazo de trinta dias.

§ 2º - Entendendo o Tribunal irregular a despesa, a Comissão, se julgar que o gasto possa causar dano irreparável ou grave lesão à economia pública, proporá ao Congresso Nacional sua sustação.

Art. 73. O Tribunal de Contas da União, integrado por nove Ministros, tem sede no Distrito Federal, quadro próprio de pessoal e jurisdição em todo o território nacional, exercendo, no que couber, as atribuições previstas no art. 96. .

§ 1º - Os Ministros do Tribunal de Contas da União serão nomeados dentre brasileiros que satisfaçam os seguintes requisitos:

I - mais de trinta e cinco e menos de sessenta e cinco anos de idade;

II - idoneidade moral e reputação ilibada;

III - notórios conhecimentos jurídicos, contábeis, econômicos e financeiros ou de administração pública;

IV - mais de dez anos de exercício de função ou de efetiva atividade profissional que exija os conhecimentos mencionados no inciso anterior.

§ 2º - Os Ministros do Tribunal de Contas da União serão escolhidos:

I - um terço pelo Presidente da República, com aprovação do Senado Federal, sendo dois alternadamente dentre auditores e membros do Ministério Público junto ao Tribunal, indicados em lista tríplice pelo Tribunal, segundo os critérios de antigüidade e merecimento;

II - dois terços pelo Congresso Nacional.

§ 3° Os Ministros do Tribunal de Contas da União terão as mesmas garantias, prerrogativas, impedimentos, vencimentos e vantagens dos Ministros do Superior Tribunal de Justiça, aplicando-se-lhes, quanto à aposentadoria e pensão, as normas constantes do art. 40. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998)

§ 4º - O auditor, quando em substituição a Ministro, terá as mesmas garantias e impedimentos do titular e, quando no exercício das demais atribuições da judicatura, as de juiz de Tribunal Regional Federal.

Art. 74. Os Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário manterão, de forma integrada, sistema de controle interno com a finalidade de:

I - avaliar o cumprimento das metas previstas no plano plurianual, a execução dos programas de governo e dos orçamentos da União;

II - comprovar a legalidade e avaliar os resultados, quanto à eficácia e eficiência, da gestão orçamentária, financeira e patrimonial nos órgãos e entidades da administração federal, bem como da aplicação de recursos públicos por entidades de direito privado;

III - exercer o controle das operações de crédito, avais e garantias, bem como dos direitos e haveres da União;

IV - apoiar o controle externo no exercício de sua missão institucional.

§ 1º - Os responsáveis pelo controle interno, ao tomarem conhecimento de qualquer irregularidade ou ilegalidade, dela darão ciência ao Tribunal de Contas da União, sob pena de responsabilidade solidária.

§ 2º - Qualquer cidadão, partido político, associação ou sindicato é parte legítima para, na forma da lei, denunciar irregularidades ou ilegalidades perante o Tribunal de Contas da União.

Art. 75. As normas estabelecidas nesta seção aplicam-se, no que couber, à organização, composição e fiscalização dos Tribunais de Contas dos Estados e do Distrito Federal, bem como dos Tribunais e Conselhos de Contas dos Municípios.

Parágrafo único. As Constituições estaduais disporão sobre os Tribunais de Contas respectivos, que serão integrados por sete Conselheiros.

O alcance das funções de controle:

Sobre o primeiro item, relativo ao ALCANCE das funções de controle e fiscalização, a orientação definida pela CRFB tem fundamento em seu artigo 70, caput, que prevê que aquelas se dão nos âmbitos: CONTÁBIL, FINANCEIRO, ORÇAMENTÁRIO, OPERACIONAL E PATRIMONIAL;

Contábil: Por fiscalização contábil considera-se tão somente o instrumento disponível para o fim de exercício da fiscalização. A técnica disponível para o exercício das funções é a contabilidade. É através desta que se fará a organização e a sistematização de receitas e despesas, visando analisar se os planos foram cumpridos pelos responsáveis em cada Poder. A ênfase aqui é sobre o controle NUMÉRICO sobre o planejamento realizado pelo gestor.

Operacional: O controle e a fiscalização devem alcançar a regularidade do procedimento destinado a obter receita e realizar a despesa.

Patrimonial: O objeto sob esta perspectiva é a própria execução dos planos, de modo que qualquer alteração patrimonial, positiva ou negativa deve estar ao alcance das funções de fiscalização e controle, objetivando assegurar o equilíbrio orçamentário.

Financeira: Compreende por objeto, os atos de ingresso e de destinação dos recursos programados nos planos e sua compatibilidade com os objetivos traçados na LOA. Alcança, portanto, todos os atos destinados a obter receita, autorizar a liberação dos recursos e a realização da despesa de acordo com os objetivos pretendidos e previstos nos planos.

Os modelos de fiscalização e o regime previsto pela ordem constitucional brasileira

O texto do artigo 70, da CRFB prevê um modelo misto de controle, compreendendo os controles interno e externo, os quais serão analisados em seguida, e nessa ordem.

O controle interno das contas públicas

Pelo primeiro modelo, incumbe a cada uma das funções do poder político (artigo 74, caput, e inciso I a IV):

a) avaliar o cumprimento das metas previstas no PPA, a execução dos programas de governo e dos orçamentos do ente federado;

b) comprovar a legalidade e avaliar os resultados, quanto à eficácia e eficiência, da gestão orçamentária, financeira e patrimonial nos órgãos e entidades da administração, bem como da aplicação de recursos públicos por entidades de direito privado;

c) exercer o controle das operações de crédito, avais e garantias, bem como dos direitos e haveres dos entes federados;

d) apoiar o controle externo no exercício de sua missão institucional.

Trata-se aqui de norma de reprodução obrigatória, razão pela qual, muito embora o texto constitucional preveja este conteúdo para a função dos órgãos de controle interno da própria União, os Estados e os municípios estão obrigados a reproduzir este mesmo regime jurídico em suas Constituições estaduais e leis orgânicas, respectivamente.

Não se trata, segundo a distinção proposta pelo constitucionalismo, de norma constitucional de repetição.

Na hipótese das normas de reprodução obrigatória há um sentido de vinculação que impõe aos demais entes federados, sua observância, mesmo que não constem dos textos resultantes do exercício de seu poder constituinte. Há um imperativo de reprodução formal e um imperativo de reprodução material. Devem reproduzir o texto, mas na hipótese de omissão sobre esta imposição, permanecem obrigados a observar seu conteúdo, mesmo na ausência de texto.

Este controle INTERNO alcança todo o iter de realização da despesa. Sendo assim, nos termos do artigo 77, da Lei n. 4.320/64, cada uma das funções do poder político, e através de seus órgãos de controle, deverão assegurar a correção dos atos necessários à realização da despesa, que a despesa está sendo realizada corretamente e, posteriormente, avaliar se a despesa efetivamente foi realizada adequadamente.

Este é o texto do artigo 77, caput, da lei n. 4.320/64, que segue transcrito:

“Art. 77. A verificação da legalidade dos atos de execução orçamentária será prévia, concomitante e subseqüente.”

O controle é, portanto, prévio, concomitante e posterior, alcançando o momento que antecede a realização da despesa, o processo de sua realização, e o momento em que já foi realizada, para o fim de confirmar a regularidade ou identificar eventuais vícios.

A matéria encontra-se regulada pelo capítulo II, título VII, da lei n. 4.320/64, na forma do artigo 77 a 80 de seu texto.

No caso de serem identificados vícios na despesa já realizada, os órgãos de controle interno estão obrigados a comunicar o Tribunal de Contas, órgão de controle externo. Na hipótese de omissão sobre este dever, o responsável responderá de forma coletiva pela ilegalidade apontada e não comunicada oportunamente (artigo 74, § 1º, CRFB).

A prestação de contas na LC n. 101/2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal)

O controle da execução orçamentária recebeu reforço considerável com o texto da Lei de Responsabilidade Fiscal, especialmente através da imposição das metas de transparência e publicidade da gestão pública, as quais alcançam, no plano geral, inclusive o imperativo de que seja incentivada a realização de audiências públicas, objetivando expor as decisões e as escolhas que foram realizadas pelo Poder Público, à deliberação coletiva (artigo 48, e Parágrafo Único, LC n. 101/2000), sendo mais evidente no planejamento municipal, onde o incentivo transmuta-se em imposição (artigo 44, lei n. 10.257/2001).

Outras imposições relevantes fixadas pela LC n. 101/2000 estão relacionadas a três instrumentos destinados a assegurar a transparência referida pelo artigo 48:

a) a consolidação nacional das contas de todos os entes federados, relativas ao exercício anterior (art. 51, LC n. 101/2000);

b) o relatório resumido da execução orçamentária (artigo 53, LC n. 101/2000);

c) o relatório de gestão fiscal (artigo 54, LC n. 101/2000);

Conforme se encontra previsto pelo artigo 51, caput, § 1º, e incisos I e II, da LC n. 101/2000, a União deverá publicar a consolidação nacional de todas as contas de todos os entes da federação, que têm prazos para seu encaminhamento ao ente central, que após consolidadas, terão de ser disponibilizadas ao acesso público.

Na hipótese do descumprimento dos prazos pelos Estados e pelos municípios, estes não poderão contratar operações de crédito perante a União e também não poderão receber transferências voluntárias, até que a obrigação seja cumprida pelos entes da federação. Entretanto, estão autorizadas as operações de crédito destinadas ao refinanciamento do valor principal da dívida mobiliária que o ente possua perante a União.

“Art. 51. O Poder Executivo da União promoverá, até o dia trinta de junho, a consolidação, nacional e por esfera de governo, das contas dos entes da Federação relativas ao exercício anterior, e a sua divulgação, inclusive por meio eletrônico de acesso público.

§ 1o Os Estados e os Municípios encaminharão suas contas ao Poder Executivo da União nos seguintes prazos:

I - Municípios, com cópia para o Poder Executivo do respectivo Estado, até trinta de abril;

II - Estados, até trinta e um de maio.

§ 2o O descumprimento dos prazos previstos neste artigo impedirá, até que a situação seja regularizada, que o ente da Federação receba transferências voluntárias e contrate operações de crédito, exceto as destinadas ao refinanciamento do principal atualizado da dívida mobiliária.”

O relatório resumido da execução tem origem no texto do artigo 165, § 3º, da CRFB que segue transcrito:

“Art. 165 [...]

[...]

§ 3º - O Poder Executivo publicará, até trinta dias após o encerramento de cada bimestre, relatório resumido da execução orçamentária.”

Este relatório será publicado pelo Poder Executivo e terá de agregar todos os Poderes e o Ministério Público, segundo se encontra definido pelo texto do artigo 52, da LC n. 101/2000, que segue transcrito:

“Art. 52. O relatório a que se refere o § 3o do art. 165 da Constituição abrangerá todos os Poderes e o Ministério Público, será publicado até trinta dias após o encerramento de cada bimestre e composto de:”

Este relatório terá por CONTEÚDO essencial (artigo 52, inciso I e II, da LC n. 101/2000):

a) balanço orçamentário, por categoria econômica, das receitas e das despesas;

b) demonstração da execuçao das receitas e das despesas.

É importante recuperar neste ponto, que a análise destes relatórios justificará a limitação dos empenhos já referida por ocasião da aula dedicada à execução orçamentária. Os critérios para a limitação dos empenhos são definidos, conforme também já ressaltado, na LDO.

O último instrumento refere-se ao relatório de Gestão Fiscal, previsto pelo artigo 54, da LC n. 101/2000, que terá de ser encaminhado e subscrito ao final de cada quadrimestre, por cada titular de Poder, além do responsável pela administração das contas (o ordenador de despesas). O relatório terá de ser apresentado até trinta dias depois de encerrado cada quadrimestre, e exposto ao público, conforme se encontra fixado pelo artigo 54, § 2º, da LC n. 101/2000.

IMPORTANTE: Assim como ocorre em relação ao prazo para encaminhamento das contas de todos os entes da federação, para o fim de consolidação, o descumprimento dos prazos relativos aos relatórios resumidos de execução orçamentária e de gestão fiscal, também implicará a aplicação da sanção que restringe a concessão de transferências voluntárias, e que restringe a contratação de operações de crédito. A aplicação desta sanção está limitada ao período em que a obrigação deixe de ser cumprida (artigos 52, § 2º, e 55, § 3º, da LC n. 101/2000, respectivamente). Note-se que, o prazo bimestral encontra uma exceção, relativa aos municípios com população inferior a 50.000 habitantes, que poderão publicar o relatório de gestão a cada seis meses, conforme prevê o texto do artigo 63, inciso II, da LC n. 101/2000.

O controle externo das contas públicas

Em relação ao controle externo, verifica-se do regime constitucional que ordena as atividades de controle e fiscalização, que sua responsabilidade é compartilhada entre os parlamentos e os Tribunais de Contas, da União, Estaduais e municipais. Estes últimos, quando existentes, e os antecedentes, em relação à titularidade do ônus sobre os recursos públicos utilizados (União ou Estados).

Trata-se de regime de controle onde a tarefa está atribuída ao parlamento, que será auxiliado pelos Tribunais de Contas, conforme orienta o artigo 71, caput, da CRFB.

O momento do controle realizado pelos Tribunais de Contas: o mesmo artigo 71, caput e, principalmente, o inciso IV, da CRFB aponta que o controle é realizado após e durante a realização das despesas, sendo possível que realize inspeções, auditorias e correições. Na constatação de irregularidades, estas terão de ser comunicadas a cada Poder, nos termos do que prevê o artigo 71, inciso XI, CRFB).

A composição dos Tribunais de Contas: trata-se de norma de reprodução obrigatória (artigo 75, CRFB) que propõe que um terço seja escolhido pelo chefe do Executivo, aprovado pelo Parlamento, alternadamente entre membros do Ministério Público especial de Contas, e auditores integrantes do quadro de carreira do Tribunal, que devem ser indicados em lista tríplice pelo próprio Tribunal, pelos critérios de antigüidade e merecimento, alternadamente. Os dois terços remanescentes são escolhidos entre os membros do Parlamento (artigo 73, §º, incisos I e II, CRFB).

As atribuições reservadas aos Tribunais de Contas:

Em relação à União, o TCU (Tribunal de Contas da União), incumbe-lhe APRECIAR as contas [do exercício anterior] que devem ser apresentadas pelo chefe do poder executivo, devendo fazê-lo no prazo de 60 dias após aberta a sessão legislativa, (artigo 84, inciso XXIV, CRFB), que tem seu início em 15 de fevereiro (artigo 57, caput, CRFB). O TCU as apreciará e emitirá parecer prévio no prazo de 60 dias após seu recebimento (artigo 57, caput, LC n. 101/2000).

Note-se que o texto constitucional faz referência à apreciação das contas, mas não menciona julgamento das mesmas, atividade que se encontra reservada ao Parlamento, in casu, ao Congresso Nacional (artigo 49, inciso IX, CRFB). O não encaminhamento das contas pelo chefe do Executivo, no prazo fixado pela CRFB implica em violação da lei orçamentária, causa capaz de justificar a apuração do comportamento, na condição de crime de responsabilidade (artigo 85, inciso VI, CRFB).

Portanto, em relação ao chefe do Executivo, o Tribunal aprecia as contas apresentadas, emite parecer prévio e aquelas serão julgadas pelo parlamento.

Há uma distinção importante que deve ser ressaltada, em relação às contas municipais. Nestas, segundo orienta o artigo 31, § 2º, da CRFB, o parecer prévio que tenha sido emitido pelo Tribunal de Contas no sentido de reprovar as contas municipais, somente deixa de prevalecer, em relação às suas conclusões, se o parlamento municipal rejeitá-lo por voto de dois terços de seus membros.

Em relação aos gestores vinculados à Administração Direta ou indireta (incluídas fundações e sociedades instituídas e mantidas pelo Poder Público), estes terão suas contas JULGADAS pelo Tribunal de Contas (artigo 71, inciso II, CRFB).

Outras atribuições reservadas aos Tribunais de Contas:

a) Controlar a legalidade de todos os atos de pessoal, para o fim de registro, na Administração direta e indireta (artigo 71, inciso III, CRFB);

b) Fiscalização das contas nacionais de empresas supranacionais de cujo capital social participe a União (artigo 71, inciso V, CRFB);

c) Fiscalizar a aplicação de recursos transferidos por convênios, acordos ou qualquer espécie de ajuste, a outros entes federados (artigo 71, inciso VI, CRFB);

d) Prestar informações sobre o resultado do exercício de suas funções (artigo 71, inciso VII, CRFB);

Os poderes dos Tribunais de Contas:

O controle das contas realizado pelos Tribunais alcança, nos termos do caput, do artigo 70, CRFB: a legalidade, a economicidade e a legitimidade das despesas. Portanto, não só elementos vinculados à forma e ao procedimento da despesa serão avaliados pelo órgão de contas, senão também as próprias escolhas e decisões tomadas por cada gestor, que devem ser sempre, aquelas capazes de destinar da melhor forma possível os recursos disponíveis (as despesas devem ter origem nas melhores propostas), e devem ser compatíveis com necessidades públicas que possam reproduzir, de fato, em prioridades que tenham de ser atendidas com recursos públicos.

Sendo assim, o desvio destas diretrizes de ordenação da atividade do gestor o sujeita à aplicação de sanções pecuniárias que vinculam pessoalmente o gestor, sanções que terão de ser proporcionais ao dano produzido ao erário público (artigo 71, inciso VIII, CRFB);

Em relação a atos administrativos ilegais, ilegítimos e anti-econômicos, na função de controle concomitante, o órgão de contas poderá fixar ao gestor, prazo para a correção da ilegalidade (artigo 71, inciso IX). Na hipótese em que não seja possível a correção do ato, ou que não tenha sido atendida a providência inicialmente ordenada pelo Tribunal, este está autorizado a determinar a suspensão de sua execução, por sua própria iniciativa, devendo comunicar da suspensão, o parlamento, no caso da União, ambas as casas legislativas (artigo 71, inciso X, CRFB).

Em relação a contratos administrativos, o Tribunal não detém poder para determinar, por sua própria iniciativa, a suspensão da relação contratual. Este poder está reservado, com exclusividade ao Parlamento. Em relação à União está atribuído ao Congresso Nacional, que deve determinar ao gestor, que adote as providências necessárias ao saneamento da ilegalidade identificada (artigo 71, § 1º, in fine, CRFB). Na hipótese em que tais medidas não tenham sido adotadas no prazo de 90 dias, incumbe ao Tribunal de Contas determinar as providências que sejam necessárias (artigo 71, § 2º, CRFB).

IMPORTANTE: Quem controla as contas dos Tribunais de Contas? Em relação à União, o artigo 71, § 4º, fixa ao Congresso Nacional o dever de fiscalizar a atividade do TCU, que lhe deve prestar contas, trimestralmente e anualmente.

O artigo 56, § 2º, da LC n. 101/2000 foi mais específico ao enfatizar que cumpre à comissão mista permanente do Congresso Nacional, composta de deputados federais e senadores [a mesma referida pelo artigo 166, § 3º, CRFB, como responsável por emitir parecer prévio sobre o projeto de LOA, e que aprecia as emendas parlamentares] sendo este modelo o mesmo que deve ser reproduzido no âmbito dos Estados e dos municípios.

Por fim, em relação aos destinatários das funções, o texto do artigo 70, caput, da CRFB de 1988 não diferencia entre pessoas físicas ou jurídicas, de modo que todos os que lidem com recursos públicos estão obrigados a prestar contas de seu uso, perante os órgãos de controle interno e de controle externo, estando sujeitos, portanto, à responsabilidade pelo uso irregular de tais recursos e à aplicação das sanções pelos Tribunais de Contas, na hipótese de julgamento das contas do gestor.

IMPORTANTE: Segundo a previsão do artigo 70, caput, não é apenas o gestor público quem presta contas perante os órgãos de controle interno e externo. O particular também tem a responsabilidade pela apresentação e exposição de suas contas sempre que fizer o uso de recursos públicos, mas o julgamento de contas pelos Tribunais de Contas alcança apenas o gestor público.

IMPORTANTE: A transparência no controle da execução orçamentária decorre de um princípio republicano que orienta o Estado de direito contemporâneo e que reforça a noção de accountability. Todos têm e devem ter direito de saber e de ter acesso ao destino de cada centavo alocado na programação orçamentária de um gestor público, direito de saber e ter acesso ao comportamento financeiro de cada gestor e, por fim, o direito de saber se cada centavo alocado na programação orçamentária vai cumprir, está cumprindo ou cumpriu seu objetivo, se cada centavo converteu-se em conseqüências materiais no plano fático. E mais do que isso, se cada centavo foi convertido em conseqüências materiais que foram, são ou estão sendo úteis à coletividade, na forma de serviços ou da materialização de direitos fundamentais.

TEMA PARA DISCUSSÃO: A atuação dos tribunais de contas em matéria ambiental. As compras sustentáveis pela Administração Pública. Instrução normativa do Ministério do Planejamento, lei municipal de São Paulo. Os efeitos de comportamentos públicos e sua influência sobre comportamentos privados, em relação à redução das emissões, e à mitigação das alterações climáticas extremas. Emprego de técnicas construtivas mais eficientes, uso de materiais ou produtos certificados com produzidos a partir de processos ambientalmente sustentéveis, medidas de eficiência energética. Todas elas contribuem diretamente para a redução das emissões, ou influenciam processos, estimulando ou desestimulando comportamentos nas cadeias produtivas relevantes para o efeito da mitigação das fontes de emissões (pecuária, agricultura, indústria madeireira, entre as principais).

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